1- ANTECEDENTESPassados quase seis meses do início da grande transformação política
ocorrida no Norte da África e em alguns países do Oriente Médio, movimento
esse que ficou sendo conhecido como “A primavera Árabe”, torna-se necessário
realizar uma atualização da conjuntura e fazer algumas considerações sobre
tema em questão.
O fato é que agora já existem alguns sinais de quem poderia se
beneficiar com esse movimento, uma vez que a “bandeira” inicial alegada que
era de transformar esses países em democracias, parece cada vez mais,
distante. O fato é que, sabidamente, esses povos nunca viveram uma
experiência democrática ao longo de suas histórias e as suas estruturas
políticas não estão preparadas para funcionar, dentro de uma conjuntura
democrática. O vácuo deixado pelos regimes totalitários está sendo,
paulatinamente, ocupado por outros líderes igualmente totalitários. Ademais, já
aparecem alguns indícios das ligações desses movimentos com grupos radicais
islâmicos que tentam tirar algum proveito da situação.
Passaremos, assim, a analisar os fatos significativos ocorridos em alguns países
onde ocorreram essas manifestações:
a) O EGITO
- A comunidade internacional já se preocupa com os rumos da revolução
no Egito. É desejo manifesto do Cairo de adotar uma política externa mais
independente. Isso se traduz em uma aproximação mais estreita com grupos
terroristas palestinos que utilizam seu território como base contra Israel. Assim,
os EUA já estão pensando em cortar a sua ajuda externa ao Egito.
- Outro sinal perturbador foi a passagem, no final de fevereiro, do
primeiro navio de guerra iraniano pelo Canal de Suez, dirigindo-se para o Mar
Mediterrâneo com destino à Síria em manobras militares. Esse fato nunca havia
ocorrido desde a Revolução Islâmica do Irã, em 1979.
- O novo chanceler egípcio, Nabil Elaraby, assegurou que seu governo
não tem a intenção de renunciar aos Acordos de paz de
o Egito e Israel, firmados em 1978. Mas, desde que assumiu, sua política
exterior ganhou independência tanto dos Estados Unidos quanto de Israel.
- No começo do mês de maio, o chanceler Elaraby anunciou, também,
após uma incomum reunião com diplomatas de alto escalão iranianos, que os
dois países “abriram uma nova página”. Desde então, o Cairo deixou claro que
tenta normalizar as relações com Teerã, algo que supõe um importante revés
para os esforços norte-americanos e israelenses destinados a isolar a República
Islâmica e forjar uma aliança de fato entre Israel, Egito e as monarquias sunitas
da Jordânia e do Golfo.
- Finalmente, cabe ressaltar que o Egito exerce uma grande influência
política na África e no Oriente Médio. As suas instituições intelectuais e
islâmicas estão no centro do desenvolvimento social e cultural da região. A sede
da Liga Árabe
dessa organização é um egípcio. Seu atual chefe, Amr Moussa é um forte
candidato às eleições presidenciais no Egito que ocorrerão em setembro. Ele foi
ministro das Relações Exteriores de Mubarak de 1991 até 2001, quando passou
a ser o secretário-geral da mencionada Liga. Amr é um seguidor da mesma
linha autocrática de Mubarak.
Camp David/USA entre1 encontra-se no Cairo e, tradicionalmente, o secretário-geral b) A LÍBIA
O quadro politico na Líbia permanece indefinido, mesmo após a tomada
de Trípoli pelos rebeldes. O paradeiro de Gaddafi é incerto e alguns especulam
que ele já teria fugido da Líbia, acompanhado de familiares e de um número
reduzido de seguidores. Gaddafi ainda conta com um pequeno apoio de parte
de suas forças armadas, embora já tenham ocorrido muitos casos de deserção.
Os EUA acompanham de perto a evolução dos acontecimentos, uma vez
que dentre os rebeldes já foram identificados militantes da rede Al Qaeda. É
certo que Gaddafi não retornará mais ao poder e seu futuro permanece uma
incógnita. Parece difícil uma saída honrosa para ele, pois a opção de receber
asílo político no exterior é remota. Ele poderia ficar exilado em uma região da
própria Líbia aguardando seu julgamento, se não for morto até o final das
hostilidades.
1
Iêmen, representantes dos palestinos, Sudão, Líbia, Tunísia, Marrocos, Kuwait, Argélia, Bahrein,
Qatar, Omã, Emirados Árabes Unidos, Mauritânia, Somália e Djibuti.
Os países-membros da Liga Árabe são o Líbano, Egito, Iraque, Síria, Jordânia, Arábia Saudita, c) A SÍRIA
O Atual presidente Bashar al-Assad se mantêm no poder, controlando as
Forças Armadas e promovendo um violento combate aos rebeldes. A Síria
sempre foi um estado policial com conceituadas e bem treinadas forças
armadas, pois tem como ameças permanentes Israel e o Líbano. Cabe ressaltar
que as tropas sírias abandonaram o Líbano em 2005, mas ainda consideram
esse país como um vassalo.
Cabe resssaltar ainda, a posição estratégica da Síria no Oriente Médio
(vide mapa). Ela tem uma grande fronteira com a Turquia e ainda permite um
acesso direto ao Mar Mediterrâneo e, consequentemente, a Europa.
2 - O IRÃ E A CRISE NO MUNDO ÁRABE
A presente crise no mundo árabe melhorou o status estratégico do Irã,
pois removeu o programa nuclear iraniano da atenção da comunidade
internacional. O aumento do preço do barril de petróleo também levou à erosão
a efetividade das sanções a ele impostas.
O governo do Irã acredita que a “onda islâmica” que está varrendo a
região, marca o início de um processo que terminará com a extinção do Estado
de Israel, e com os sionistas fugindo para seus países de origem. Depois que os
Estados Unidos derrubaram o regime iraquiano em 2003, o Irã sentiu-se
cercado. Agora, Teerã se vê a caminho de completar um "cerco" regional a
Israel - com o Hezbollah ao Norte e o Hamas ao Sul.
O colapso da antiga ordem árabe nos países sunitas moderados do
Oriente Médio é, pelo menos a curto ou médio prazo, é favorável a Teerã e
melhorou significativamente o status geoestratégico do país e sua habilidade de
promover um programa pan-islâmico xiita ambicioso.
O Irã está aproveitando a atual comoção no mundo árabe e a confusão
do Ocidente, para intensificar sua intervenção, influência e interferência nas
regiões que estavam anteriormente sob a influência dos Estados Unidos e do
Ocidente. Assim, ele deverá buscar e preencher o vazio resultante, servindo
como modelo
iranianos não são árabes e sim persas.
islâmico de oposição e independência. Cabe a ressalva de que os 3 – A TURQUIA E A CRISE NO MUNDO ÁRABE
FIGURA 3 – A TURQUIA
A República da Turquia, é um país euro-asiático que ocupa toda a
Península da Anatólia, no extremo ocidental da Ásia e se estende pela Trácia
Oriental (conhecida como Rumélia), no sudeste da Europa (vide mapa).
A localização da Turquia entre a Europa e a Ásia, dominando os estreitos
de Bósforo e Dardanelos (a única saída do Mar Negro) fazem o país
geoestrategicamente importante. A religião predominante na Turquia é o
Islamismo, com minorias de cristãos e de judeus. Os turcos não são árabes e
não devem ser confundidos como tal. A língua oficial é o turco, falado pela
esmagadora maioria da população. A segunda língua mais usada é o curdo
falada pela maior minoria do país, os curdos, que representam cerca de 18%
da população. As restantes minorias constituem entre 7 e 12% do povo.
Em razão de sua localização estratégica, sua pujante economia e suas
forças armadas (segundo país em efetivo militar na OTAN e com o orçamento
de 19 bilhões de US dolares), a Turquia é classificada como uma potência
regional.
O atual primeiro-ministro é o ex-prefeito de Istambul, Recep Tayyip
Erdogan membro do Partido da Justiça e da Liberdade (AKP), de tendência
conservadora e islamista moderada, que ganhou a maioria absoluta dos
assentos parlamentares nas eleições gerais de 2002. Desde então, a Turquia
vem se aproximando do mundo islâmico.
Atualmente, o país enfrenta uma crise em suas Forças Armadas devido a
uma suposta tentativa de golpe militar que teria sido planejada logo após a
posse de Erdogan. Assim, encontram-se presos e ainda aguardando
julgamento cerca de 250 generais, almirantes, e oficiais de outras patentes,
sendo que alguns deles permanecem em serviço. No final do mês de julho o
primeiro-ministro Erdogan exonerou todo alto comando das forças armadas
turco numa inequívoca prova de que ainda existe tensão entre o governo e os
militares.
As forças armadas turcas, ao que parece, perderam o poder e a
influênciua que sempre tiveram desde o fim do Império Otomano e a criação
da “Nova Turquia” por Mustafa Kemal Ataturk, ex-oficial do exército Otomano,
heroi nacional e o primeiro presidente da Turquia.
Existem, ainda, denúncias sobre a prisão de muitos jornalistas e que a
Turquia seria hoje, o país onde haveriam mais profissionais da imprensa
detidos, superando a China e o Irã.
Com referência aos recentes acontecimentos no Oriente Médio a Turquia,
até um passado próximo, mantinha uma posição de proximidade com o
governo da Líbia (o presidente Gaddafi recebeu em dezembro último na
Turquia, um prêmio internacional pela paz), com a Síria e com o Irã. Ela apoia
os movimentos palestinos do Hamas e do Hezbollah contra o Estado de Israel.
4- CONCLUSÃO
Gostaríamos de concluir esta breve Apreciação afirmando que no mundo
árabe não existe unidade e nem uma filosofia comum. O tribalismo é uma
realidade. Alguns estados árabes possuem profundas divergências entre si, não
obstante existam tentativas de uni-los por intermédio de alianças, conferências,
encontros e protestos. A hipocrisia é evidente. Todas as tentativas até hoje
feitas para unir os povos árabes falharam. A mais recente foi articulada pelo
então presidente do Egito Gamal Abdal Nasser quando, em 1958, criou a
República Árabe Unida (RAU), a "nação pan-Árabe", unindo o Egito e a Síria.
Essa aliança foi logo desfeita em 1961.
Assim, concluímos que é muito remota a possibilidade da união dos
povos árabes em torno de objetivos nacionais comuns e que passem a
representar uma ameaça concreta ao Ocidente.
Entretanto, os analistas de Inteligência Estratégica e demais interessados
nas questões árabes e do Oriente Médio devem voltar suas atenções para dois
países: o Irã e a Turquia. Eles são importantes atores na atual conjuntura e em
seus futuros desdobramentos.