Hora de arrumar a casa
Os problemas do Brasil já foram medidos por trocentos índices sociais, brasileiros e internacionais. As metas para as políticas públicas estão claras. As mazelas estão listadas e quantificadas
Nadja Sampaio nadja.sampaio@brasileconomico.com.br
Pronto. A eleição acabou, voltamos a vida normal, é hora de voltar a pensar, e solucionar, os problemas do dia a dia. Por exemplo, terminar as obras que ficaram paradas esperando para ver quem seria o próximo governador. No Rio, é preciso terminar de tirar a perimetral e acabar a obra do Porto. Quem passa pelos enormes engarrafamentos em torno da rodoviária não aguenta mais esperar a obra andar. A nível nacional, é também uma boa hora para as empresas arrumarem a casa e trabalharem no sentido de diminuírem os problemas resultantes da má oferta. Temos que pensar numa agenda prática. Que tal pensar fora da caixinha e premiar o produto que menos dê problema de cobrança indevida? Ou, o combo mais honesto?
O Brasil tem que aprender com as mulheres a fazer várias coisas ao mesmo tempo. Parar o país de dois em dois anos, por pelo menos seis meses, para cuidar de eleição, já é um tempo enorme parado. Além disso, nosso calendário ainda teve que incorporar uma Copa e daqui há um ano e meio, vai entubar uma Olimpíada e outra eleição. Então, não dá para ficar esperando o Congresso ficar remanchando, que nem criança com birra, sem querer fazer o dever de casa.
Obviamente, as discussões em torno das reformas nacionais, política e tributária, vão continuar numa discussão sem fim porque nenhum político e nenhum estado quer ceder. E elegemos um Congresso ainda mais conservador, com aumento nas bancadas ruralista e religiosa. Ninguém quer sair da zona de conforto e nem perder regalias. Mas o resto do Brasil continua a andar, então, é preciso começar logo a investir na educação, no saneamento básico, nas estradas, nos portos, nos transportes públicos, na segurança, em outras matrizes energéticas. Enfim, melhorar logo a vida das pessoas. Gerar emprego investindo nestas áreas. E rapidamente, sem mais adiamentos.
Por outro lado, esta é uma boa hora para as empresas também desentupirem seus canais de informação e trabalharem para diminuírem a quantidade de reclamações repetitivas em todos os procons do Brasil. Um levantamento do Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (Sindec) do Ministério da Justiça, que reúne informações dos procons de todo o Brasil, mostra que, nos últimos dez anos (de outubro 2004 a outubro 2014), cobrança indevida foi o problema mais reclamado, totalizando 2,74 milhões de reclamações, ou seja, 22% dos 12,35 milhões de registros. Entidades de defesa do consumidor afirmam que a maior parte destas reclamações deriva-se da má qualidade da oferta.
Ou seja, as empresas não sabem se comunicar com o consumidor, não conseguem falar com o seu público-alvo sem induzi-lo a erro. Pensamos logo que esta é uma forma fácil de ganhar dinheiro, pois nem todo mundo reclama, e este percentual de consumidores lesados, que estão pagando a mais, mostrado pelo Sindec, deve ser, na realidade, bem maior.
As empresas sempre relativizam o número de reclamações, citando a base de clientes e tentando mostrar que o número é ínfimo. Não entendo este raciocínio de defesa. Se o problema é pequeno para as empresas, acabem logo com ele. Trabalhem para saírem das listas das empresas com mais reclamações do Sindec.
As empresas que estão no topo das mais reclamadas ganharam uma boa fatia do público C e D, e o número de reclamações mostra que as companhias ainda não estão sabendo se comunicar com este novo público. Esta é a hora de arrumar a casa, melhorar treinamentos, rever estratégias de marketing, de vendas e de pós-venda. No mínimo, para não perder clientes. Conquistar é caro, reconquistar é muito mais caro.
Cobrança indevida ou abusiva é um problema tão comum no Brasil, que somente ele reúne mais queixas do que os outros quatro problemas que vêm a seguir na lista: produto com vício, 804 mil reclamações; problemas com garantia, abrangência de cobertura, etc, 802 mil; questões com contrato (alteração, irregularidade, rescisão, etc), 530 mil; e não entrega ou demora na entrega do produto, 462 mil.
Só de olhar esta lista dá para ver de onde vêm os problemas. A cobrança indevida, está, obviamente, ligada à telefonia e aos bancos. No segundo, o produto com defeito vai para assistência técnica e a garantia estendida não funciona. Questões com contrato estão intimamente ligadas a bancos e aos cartões de crédito. E, por fim, não entrega do produto, denuncia a velha questão da logística do varejo, que também esbarra nos problemas de infraestrutura do país.
Os problemas do Brasil já foram medidos por trocentos índices sociais, brasileiros e internacionais. As metas para as políticas públicas estão claras. As mazelas estão listadas e quantificadas. Os objetivos dos brasileiros para chegarmos a uma sociedade mais justa foram deixados claros nesta eleição. Então vamos acabar com as obras que foram começadas e tratar de investir logo nas melhorias que estão na nossa cara e ao alcance das mãos dos dirigentes neste momento. Enquanto isso, o Congresso discute a reforma política, a reforma tributária, a criminalização da homofobia, a maioridade penal, o aborto, a descriminalização da maconha, etc. O povo vai cobrar, os políticos e empresários vão ter que melhorar. Vai dar trabalho arrumar a casa, mas a limpeza já começou.