quarta-feira, 15 de outubro de 2014

O exemplo de Morales
Foi impressionante a vitória de Evo Morales nas eleições de domingo na Bolívia
Octávio Costa ocosta@brasileconomico.com.br
Aos 54 anos, o líder indígena foi reconduzido pela segunda vez à Presidência, com mais de 60% dos votos. A apuração oficial está atrasada, mas o empresário do cimento Samuel Medina, que ficou em segundo lugar, não deve passar de 20%. É bem possível que Morales supere a marca de 2009, quando recebeu 64% dos votos. Venceu em oito dos nove estados, até mesmo em Santa Cruz, um dos principais polos econômicos do país e região refratária às políticas antiamericanas e estatizantes do atual governo. Morales atribuiu sua vitória às reformas socializantes que reduziram a pobreza e erradicaram o analfabetismo. No poder desde 2006, ele vai governar a Bolívia até 2020.
Há quem atribua a reeleição de Morales ao bom desempenho da economia boliviana, que deve crescer 6,5% este ano e mereceu elogios do Fundo Monetário Internacional. Em artigo publicado ontem, Celso Ming, decano do jornalismo econômico brasileiro, afirmou que a Bolívia chegou aonde chegou porque tem seguido à risca o receituário ortodoxo, sob o comando do ministro da Economia, Luiz Alberto Arce. O zelo com os fundamentos sólidos, na visão de Ming, seria um diferencial em relação à matriz de cunho keynesiano adotada por Guido Mantega, com o aval da presidente Dilma Rousseff.
O ministro Arce, porém, não se considera um adepto da ortodoxia pregada pelo FMI. “Chegamos aos resultados que os economistas neoliberais pedem sem usar as fórmulas deles. Usamos nosso modelo, que tem ingerência do Estado e investe dinheiro na área social”, disse, enfatizando que a estabilidade econômica não é patrimônio do FMI.
É certo que a Bolívia também se beneficiou da alta nos preços das matérias-primas que exporta – gás natural e minérios —, mas o que pesou na eleição de domingo não foi apenas o sucesso da economia. Segundo Arce, o mérito maior do governo Morales foi a nacionalização da produção de commodities, que permitiu ao país se capitalizar e investir em educação, saúde e projetos sociais.
O ministro fez referência ao gás natural, que responde por um quinto do PIB nacional. Com a nacionalização, 85% de U$ 6 bilhões exportados pelo setor ficam nas mãos do Estado e apenas 15% em poder das multinacionais. Isso tem permitido que as contas externas fechem com fortes superávits e que o setor público amplie os programas de inclusão social sem desequilíbrio fiscal.
Está claro, portanto, que a retumbante vitória de Evo Morales não se deve a um esforço de marketing político ou à desconstrução dos adversários. O carismático boliviano foi reeleito por um motivo muito simples: fez um bom governo e teve o reconhecimento da maioria de seu povo. Se no Brasil o eleitorado está dividido entre a presidente Dilma e o senador Aécio Neves, não é por acaso. Algo saiu errado nos últimos anos. Ao contrário de Morales, o governo Dilma enfrentou dificuldades e não conseguiu repetir o êxito dos mandatos de Lula.
Um dos pontos de desgaste foi o loteamento político da máquina administrativa. Se for reeleita, é de se esperar que Dilma Rousseff, uma executiva de competência comprovada, não repita o equívoco de entregar postos-chaves a limitados dirigentes de partidos aliados. Que fique o exemplo da Bolívia. A boa gestão é um excelente cabo eleitoral. Dá um caminhão de votos.