Justiça
se faça a Joaquim
Goste-se ou não dele,
concorde-se ou não com o desfecho do caso, o presidente do STF marcou época com
o julgamento do mensalão
ocosta@brasileconomico.com.br
O mineiro Joaquim Benedito Barbosa Gomes entrou para a história do país em 25
de junho de 2003 ao se tornar o primeiro ministro negro do STF, por escolha do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Os dois têm na origem humilde um
traço comum. Nascido em Paracatu em 1954, filho de um pedreiro e uma dona de
casa, Joaquim é o primogênito de oito irmãos. Arrimo de família após a
separação dos pais, foi para Brasília aos 16 anos. Completou o segundo grau e
formou-se em Direito pela UnB, onde obteve o mestrado. Depois de trabalhar como
oficial de chancelaria, prestou concurso para procurador da República, mas
pediu licença para se aperfeiçoar na Universidade de Paris II. Também foi
“visiting scholar” da Universidade de Colúmbia, em Nova York, e da Universidade
da Califórnia, em Los Angeles. É fluente em francês, inglês, alemão e espanhol.
Esse breve perfil é importante para que não paire dúvida sobre
os méritos do atual presidente do STF. A trajetória de Joaquim no mundo do
Direito é irretocável. Não foi por acaso que a tradicional revista Time, em
2013, incluiu seu nome na lista de cem pessoas mais influentes do mundo. Mas
também não espanta que muita gente tenha comemorado a notícia de que Joaquim decidiu
deixar o STF onze anos antes do prazo de aposentadoria previsto em lei.
Aos 59 anos, ele poderia continuar até 2024 no seletíssimo grupo
de 11 ministros que interpretam e aplicam o que está escrito na Constituição
brasileira. Mas, por motivo pessoal (provavelmente pelo problema insanável na
coluna, que o incomoda há anos), ele resolveu antecipar o pedido de
aposentadoria para o fim de junho. E comunicou, na manhã de ontem, sua decisão
à presidente Dilma Rousseff e aos presidentes da Câmara e do Senado.
Na passagem pelo STF, Joaquim se fez respeitar pelos pares, mas,
com seu gênio forte, também criou desafetos. Alvo do pavio curto e das palavras
duras do colega, o ministro Ricardo Lewandowski, por exemplo, só continuou a
cumprimentá-lo por dever de ofício. Outros ministros, ao se sentirem ofendidos
em plenário, retrucaram à altura, sem se intimidar com a transmissão direta das
sessões pela TV Justiça. Entre os jornalistas que cobrem o Judiciário, o
presidente do STF também firmou a imagem de intransigente.Vai aqui um exemplo.
Ao receber um editor da revista ISTOÉ, Joaquim explicou que
falaria sobre o processo do mensalão “off the record” e advertiu: “Se eu for
citado como fonte na reportagem, nunca mais falo com os senhores. Que isso
fique bem claro!”. O ministro é assim mesmo e ponto final.
Seria, porém, enorme injustiça destacar em Joaquim Barbosa
apenas o pavio curto. Goste-se ou não dele, concorde-se ou não com o desfecho
do caso, o presidente do STF marcou época com o julgamento do mensalão. Foi o
que disse Marco Aurélio Mello, ao comentar a aposentadoria precoce do colega.
“Veio a ser relator de uma ação importantíssima em que o Supremo acabou por
reafirmar que a lei é lei para todos indistintamente. Acabou por revelar que
processo em si não tem capa. Tem conteúdo”. Após o elogio, concluiu: “Que seja
muito feliz”.
Esse certamente é o desejo das pessoas que apoiaram as decisões
independentes do filho de Paracatu, que superou todos os obstáculos da vida até
ocupar o cargo máximo do Poder Judiciário.