segunda-feira, 31 de março de 2014

Olhar do Planalto - Dependência externa
31/03/14 11:15 | Sonia Filgueiras (sonia.filgueiras@brasileconomico.com.br)

Em seu recém-divulgado relatório de inflação, o Banco Central lançou algumas nuvens sobre o futuro da economia brasileira
Em primeiro lugar, ao prever menos crescimento (2% em 2014, contra 2,3% em 2013) e mais inflação (6,1% e não mais os 5,6%, como estimado em dezembro), o banco sinalizou que ainda deverá subir as taxas de juro por mais algum tempo, talvez além da próxima reunião do Copom, nesta semana. Em outras palavras, o Banco Central calibrou o crescimento (para baixo) a uma taxa de juro mais elevada, necessária para combater uma inflação igualmente elevada.
A questão é que a necessidade de estender os juros elevados por mais tempo compromete o vigor da atividade econômica. Por isso, na avaliação do economista e ex-diretor do Banco Central Carlos Thadeu de Freitas, a expansão econômica nada brilhante de 2% estimada para 2014 se repetirá em 2015. "Na situação atual, qualquer crescimento acima disso dependerá da atividade econômica internacional", avalia. "E nada indica que haverá um boom na atividade internacional nos próximos dois anos. Será uma recuperação lenta", completa.
Apesar de todos os esforços do governo com o programa de concessões de ferrovias, portos, estradas e aeroportos, investimentos públicos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e desembolsos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) a juros subsidiados, o impulso interno dado pelos investimentos tende a esbarrar no limite imposto pelo aperto monetário: se o juro sobre, o custo do investimento sobe. Em suas previsões para o PIB deste ano, o Banco Central prevê expansão de apenas 1% para a taxa de investimento, contra os 6,3% registrados no ano passado.
Embora o banco chame a atenção de que a perspectiva de desaceleração em 2014 reflete, em parte, o chamado carregamento estatístico do último trimestre de 2013 (ou seja, como o investimento cresceu muito no final do ano, a base de comparação é elevada), há a outra parte, resultante do aumento do custo do dinheiro, que dificulta a vida do empresário que deseja pegar empréstimos para expandir a produção.
Dado o contexto restritivo dos investimentos, o baixo nível de confiança dos empresários e alguns custos elevados, que barram a produtividade - os dirigentes do BC vêm insistindo que a "inflação dos salários", de 9% acumulados em 12 meses em janeiro, está "muito alta"- faz sentido a módica expansão na indústria prevista pela instituição para 2014: 1,5%, contra 1,3% registrados em 2013.
O pequeno aumento no ritmo é explicado pela reversão, de -2,8% para 4,0%, do desempenho da indústria extrativa mineral e à expansão maior na produção de eletricidade, gás e água. No caso da indústria de transformação (máquinas e equipamentos, alimentos, bebidas, metalurgia, caçados e derivados de pretório, dentre outros), a previsão é de desaceleração no crescimento: 0,5% de expansão, ante 1,9% em 2013.
Assim como Carlos Thadeu de Freitas, o Banco Central não põe muita fé no impulso externo para ajudar a economia interna: a previsão do banco é de um crescimento de 1,3% nas exportações, contra a expansão de 2,5% registrada em 2013. A boa notícia é que, por causa da desvalorização cambial, o ritmo de expansão das importações deve ficar bem mais lento: depois de crescer 8,4% em 2013, o BC aposta que elas assumirão um ritmo bem mais moderado, com crescimento de 0,9%. Por fim, como o Banco estima um crescimento do consumo das famílias mais moderado (a expansão de 2%, contra os 2,3% registrados em 2013), a instituição prevê, da mesma forma, redução da velocidade de expansão do Comércio como um todo.
O cenário pode melhorar se o dólar se mantiver comportado e não empurrar a inflação para cima, diz Carlos Thadeu. Isso pode abrir ao BC espaço para encerrar o ciclo de aperto monetário mais cedo. Mas também pode piorar se for confirmada a sinalização do Fed (banco central americano) no sentido de antecipar o processo de retirada dos estímulos fiscais. O BC brasileiro poderá se ver obrigado a estender ainda mais o ajuste nos juros de forma a manter o interesse dos investidores no Brasil e evitar que, com a saída de recursos, ocorra uma desvalorização excessiva do real, gerando pressões inflacionárias extras. "Tudo desaba no colo do BC" conclui Thadeu de Freitas. Neste, e no próximo ano.
O tamanho do ajuste
Embora o governo tenha se comprometido em realizar uma economia de 1,9% do PIB (ou R$ 91,306 bilhões) nas contas públicas em 2014 (incluindo governo central, estados e municípios), o mercado financeiro prevê hoje que conseguirá no máximo 1,5% (algo em torno de R$ 78 bilhões). Não atingir a meta não chegaria a ser um problema. O importante, avaliam os analistas, é que a direção dada está correta.
Mas para 2015, o mercado espera um superávit de 2% do PIB, ou R$ 104 bilhões em valores de hoje (utilizando a estimativa de PIB da Fazenda). Exige-se um esforço adicional de R$ 26 bilhões para dar conta de todos os ajustes esperados para 2015, a começar pelo alinhamento das tarifas públicas, hoje represadas. Para que a correção não se torne inflação, o BC poderá ser obrigado a agir subindo os juros, o que elevará os gastos do governo com a dívida. O problema: um superávit maior com crescimento econômico estacionado nos 2%, o que não ajuda nas receitas governamentais.