A nova ordem financeira
Os que desdenhavam
das cúpulas do Brics, afirmando que se limitavam a conversas sem efeito, verão
agora o primeiro resultado institucional do grupo: o Novo Banco de
Desenvolvimento
Florência Costaflorencia.costa@brasileconomico.com.br
O tema do encontro deste ano é “Parceria dos Brics: um fator pujante do
desenvolvimento global” com o foco mais em uma agenda econômica. As previsões
negativas e sombrias sobre o futuro dos Brics, boa parte vindas dos países
ricos, não foram poucas. Mas o fato é que há uma expectativa grande e uma
aposta de que a nova instituição vai ajudar as economias emergentes a conseguir
investimentos necessários para infra-estrutura, já que as atuais instituições
de Bretton Woods deixaram muito a desejar. Apesar do fato de o Brics ter sido
criado para discussões informais em questões de desenvolvimento global, o grupo
aumentou o seu leque de atuação e passou a seguir mais uma política de
integração econômica.
Segundo Amar Bhattacharya, economista do Programa de Desenvolvimento e
de Economia Global do Brookings Institution, a infra-estrutura continua sendo o
grande entrave dos emergentes e pobres: 1,4 bilhão de pessoas não tem acesso à
eletricidade, quase 1 bilhão não contam com água potável e 2,6 bilhões não
sabem o que é sistema sanitário. Energizado com a criação do banco, o Brics
ganhará uma cara nova, como observou o subsecretário-geral político do
Ministério das Relações Exteriores, embaixador José Alfredo Graça Lima.
Ex-dirigente da Infosys, gigante da Tecnologia da Informação, e do
ICICI, o maior banco privado da Índia, Kamath deixou claro que o banco que
dirigirá, com sede em Xangai, não limitará o escopo de suas operações aos
países-membros do grupo. O banco não carrega o nome Brics de propósito: para
permitir a participação de novos países no clube de economias emergentes no
futuro. Mas a ideia inicial é de que a instituição financie, por um dois anos,
somente os Brics antes de aceitar novos membros.
O banco terá um capital autorizado inicial de US$ 100 bilhões, sendo que
o capital social inicial será de US$ 50 bilhões, a serem compartilhados entre
os membros fundadores. Em janeiro do ano que vem, a instituição elegerá cinco
iniciativas apresentadas pelos países do Brics. O banco vai garantir a
possibilidade de realizar financiamentos na moeda local do país em que a
operação acontecerá.
Também entrará em vigor em 30 dias o Tratado para o Estabelecimento de
um Arranjo Contingente de Reservas do Brics. Os recursos deste fundo serão
acessados pelos países do bloco em momentos de crise, quando algum deles
enfrentar pressões em sua balança de pagamento. O fundo financeiro vai ter um
capital inicial de US$ 100 bilhões, com aporte de US$ 41 bilhões da China, US$
18 bilhões do Brasil, da Índia e da Rússia, cada um, e US$ 5 bilhões da África
do Sul. O mecanismo vai reforçar a confiança dos agentes econômicos e
financeiros mundiais e amenizar o risco de contágio de eventuais choques que
possam afetar as economias do bloco.
Ao mesmo tempo, na última segunda-feira, representantes de 57 países
cofundadores do Banco Asiático de Investimento em Infra-estrutura (AIIB), com
um capital aprovado de U$100 bilhões e liderado pela China, assinaram, em
Pequim, o acordo sobre a criação da instituição, que deverá começar a funcionar
no fim deste ano, com o foco em projetos na Ásia. As duas instituições são
fruto dos passos de tartaruga das reformas, há tanto tempo exigidas pelos
emergentes, das entidades multilaterais de financiamento como Fundo Monetário
Internacional (FMI), Banco Mundial, e Banco de Desenvolvimento Asiático, vistas
como dominadas pelos interesses europeus, americanos e japoneses.
Mais ainda: com o objetivo de garantir a segurança energética do Brics,
o grupo irá discutir uma associação no setor, com a criação de um banco de
reservas de combustível e um instituto de políticas de energia para fazer
pesquisas integradas e análises dos mercados globais. O centro industrial de
Ufa — um nome que soa engraçado aos ouvidos brasileiros, mas que significa
“águas escuras”, localizado nas encostas ocidentais dos montes Urais — estará
agitadíssima na semana que vem. Isso porque a cidade russa vai sediar outro
importante encontro: o da Organização para Cooperação de Xangai, fundado por
China, Rússia, Cazaquistão, Quirguistão, Tadjiquistão e Uzbequistão, e que
agora abraçará dois países rivais:
Índia e Paquistão. Esta organização é vista como um instrumento de
reforço da Eurásia e desta estratégia multinacional de desenvolvimento da China
do século XXI. Uma forma de contrabalançar a aproximação dos Estados Unidos com
os países do Sul da Ásia.