quinta-feira, 2 de julho de 2015


Quem cuida da energia do Brasil?

Somente nos três primeiros meses deste ano, a cobrança adicional por conta das bandeiras tarifárias chegou a R$ 600 milhões. A conta poderá ser aumentada a qualquer momento

Nadja Sampaionadja.sampaio@brasileconomico.com.br

Fico muito irritada quando o governo coloca nas costas do consumidor a culpa pelo preço da energia e diz que é preciso economizar mais. É óbvio que as pessoas já estão economizando, até porque, o aumento da conta foi uma facada nas costas. Agora, não venham dizer que estamos pagando mais pela bandeira tarifária porque o consumo está alto e é preciso utilizar as termelétricas. Estamos pagando mais por causa da ineficiência do Estado de gerar energia. E quem cuida da energia, há pelo menos 12 anos, é a própria presidenta Dilma. Nem pode terceirizar esta responsabilidade.

Algo que me irritou muito foi um anúncio feito pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e pela Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), que, felizmente, já saiu do ar. Na propaganda, o texto interpretado pela atriz Taís Araújo, dizia que as bandas tarifárias foram criadas para avisar ao consumidor quando era preciso economizar. Como assim? As bandeiras tarifárias indicam que a produção de energia está baixa e, por causa disso, será necessário comprar energia das termelétricas, não tem nada a ver com o uso.

E por que a produção de energia está baixa? O governo vai responder que é porque não choveu nas cabeceiras dos rios e, portanto, as hidrelétricas estão com níveis muito abaixo do necessário. E como o consumidor poderia fazer para chover mais e melhorar o nível dos reservatórios? Mesmo se não usássemos nenhuma energia, os reservatórios continuarão baixos. Portanto, o consumidor não tem culpa de a bandeira tarifária estar sempre vermelha e nada pode fazer para ela voltar a ser verde.

Aliás, se o consumidor pudesse fazer alguma coisa, faria, porque a invenção das bandeiras foi uma forma de o governo repassar um custo que ele deveria absorver. O governo está se aproveitando deste fator para aumentar a tarifa das bandeiras. Somente nos três primeiros meses deste ano, a cobrança adicional por conta das bandeiras tarifárias chegou a R$ 600 milhões. E como o consumidor não pode fazer nada para se livrar deste novo imposto que acabou incorporado à tarifa, a conta poderá ser aumentada a qualquer momento, basta o governo aumentar o valor. Como já o fez. Ao anunciar as bandeiras, o valor para a vermelha era de R$ 3 para cada 100kW/h. O Governo, então, aumentou para R$ 5 a mais por cada 100kW/h para a bandeira vermelha, e R$ 2,50 por 100kW/h, se for amarela.

E, ainda por cima, levamos outro tranco financeiro, desta vez do governo estadual, porque os 27% do Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICMS) e os 9% de PIS/Cofins são calculados em cima do valor total da conta de energia, incluindo a nova cobrança das bandeiras. Quer dizer, o consumidor está pagando a mais e os governos, federal e estadual, estão se aproveitando da falta de chuva no lugar certo, para engordarem seus cofres. Até porque a demanda de energia caiu. E não só porque o consumidor está economizando, mas porque o país está em recessão, produzindo menos, inclusive produtos de alto gasto energético, como aço. O gasto é menor, mas o governo ganha mais com a conta de luz.

O governo culpa a seca, e só se esqueceu de combinar com São Pedro onde ia chover. Era melhor contratar um pajé para Ministro de Minas e Energia, pelo menos seria alguém com mais conhecimento da natureza. Mas nem era necessário contratar um adivinho. É só olhar para os estudos que confirmam o aquecimento global e o desmatamento da Amazônia para saber que não dá para contar com os rios para sempre, principalmente porque estamos assoreando e matando as nascentes.

Ao invés de passar anos discutindo o impacto ambiental e impondo a hidrelétrica de Belo Monte às populações ribeirinhas, o governo federal poderia ter investido mais em energia eólica no Nordeste, por exemplo, e feito linhas de transmissão suficientes para que as energias alternativas não utilizadas se somassem à rede elétrica. Este é o caso do parque de Osório, no Rio Grande do Sul, que não utiliza toda a energia produzida e poderia transferir à rede.

E já que a própria presidenta era a mãe do PAC, poderia ter juntado à construção das casas o uso de placas solares, o que traria diversos resultados. O morador economizaria na conta de energia elétrica e teria água quente; o que não fosse utilizado de energia poderia ser devolvido para a rede e isso estimularia os empresários na área de energia solar a investirem, já que teriam uma demanda garantida. No longo prazo, diminuiria o valor inicial de implantação da energia solar, o que seria um benefício para toda a população que optasse por utilizar esta forma de energia alternativa.

Agora, a presidenta diz, em um acordo com o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, que vai erradicar o desmatamento ilegal até 2030. Não está fazendo mais do que a obrigação, se é ilegal. O duro de ouvir é que vai levar 15 anos para cumprir a lei. Aliás, a gente tem tudo para fazer o melhor, mas vive na lanterninha. Fomos os primeiros a ter um biocombustível como o etanol, primazia elogiada no mundo todo. O que fizemos? Acabamos com o projeto do etanol e os carros flex só estão rodando a gasolina. Por outro lado, a presidenta manteve o valor dos combustíveis mais baixos do que no mercado internacional, o que ajudou a quebrar a Petrobras. Temos a maior mata atlântica do mundo, e o que estamos fazendo? Estamos desmatando para o agronegócio e para a criação extensiva de bois, o que foi aplaudido pela presidenta. No outro lado do mundo, a China, que nunca teve sol e chuva como nós, dos trópicos, está ganhando, de lavada, no uso da energia solar. O país quer produzir dois gigawatts a cada dois meses com energia solar. Esta é a meta brasileira, para um ano, mas em 2023. Quem é mesmo que cuida da energia no Brasil?