quarta-feira, 13 de junho de 2012

Em busca da estratégia perdida
13/06/12 07:31 | Miguel Setas - Vice-presidente de distribuição e inovação da EDP no Brasil

Recentemente ouvi dois grandes empresários brasileiros desvalorizarem a importância do planejamento estratégico. O primeiro foi Marcelo Odebrecht e o segundo David Feffer, presidentes do Grupo Odebrecht e do Grupo Suzano, respectivamente.
Marcelo Odebrecht crê que os processos de planejamento estratégico "são uma forma de destruir valor" nas empresas e que têm um papel essencialmente "motivacional". David Feffer esclareceu que "evitaram o maior erro do Grupo Suzano graças a não terem seguido o planejamento estratégico". Cada um, de formas distintas, assumiu que a estratégia, hoje, é não ter estratégia.
Para mim, ex-consultor da McKinsey, estas palavras pareceram, numa primeira impressão, uma blasfêmia. Nos anos 90, quando aplicava as metodologias de planejamento estratégico mais evoluídas para a altura, não havia dúvida que aquela era uma forma inquestionável de criar valor para os clientes.
Projetávamos a visão da empresa para distintos cenários, num horizonte de 10 anos, e depois fazíamos o chamado "roll-back the future" para chegar ao planejamento operacional de curto e médio prazos. Não falhava...
Hoje devo reconhecer que o cenário de negócios "V.U.C.A" - acrônimo das forças armadas americanas para V de volatility (volatilidade), U de uncertainty (incerteza), C de complexity (complexidade) e A de ambiguity (ambiguidade) - veio retirar visibilidade sobre o que se passará no mundo nos próximos 10 anos. Estamos num momento de descontinuidade. Odebrecht e Feffer estão certos. Já não podemos confiar cegamente nos processos do século passado.
Por isso, também o exercício de estratégia se está ajustando ao novo cenário mundial. Agora, nestes tempos de incerteza, o que parece ser o caminho unânime é o aproveitamento da "sabedoria coletiva", através do chamado "crowdsourcing".
Por conseguinte, os novos processos de formulação estratégica são coletivos e abertos à participação de múltiplos stakeholders, tanto internos como externos, em vez de funcionarem apenas no circuito fechado dos Conselhos de Administração e das firmas de consultoria.
Na EDP Energias do Brasil também já adotamos aquilo a que podemos chamar um modelo de "crowd-strategy" (nome inspirado no "crowdsourcing"), e colocamos as prioridades estratégicas da unidade de negócios da Distribuição para votação dos seus cerca de 2 mil colaboradores, na intranet da empresa. Há 20 anos não teria sido possível e seria considerada uma atitude imprudente. Mas os tempos mudam.
No entanto, julgo que o ponto de chegada dos processos de pensamento estratégico ainda não é o que conhecemos atualmente. A evolução do estudo da teoria do caos e de sistemas complexos não lineares deve levar-nos à capacidade de modelagem do comportamento dos mercados e das organizações.
Quando formos capazes de simular o comportamento dos indivíduos e das suas complexas relações em sociedade, teremos mais instrumentos para definirmos estratégias empresariais eficazes - talvez lhe possamos chamar "chaos-strategy". Uma coisa é certa, temos que continuar em busca da estratégia perdida...
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Miguel Setas é vice-presidente de distribuição e inovação da EDP no Brasil