quarta-feira, 13 de junho de 2012

A opção pelo subdesenvolvimento
13/06/12 07:36 | Rodrigo Sias - Economista do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

A Argentina é um país sem igual. Dono de uma geografia privilegiada, grande território, inúmeras riquezas minerais e com uma população alfabetizada, o país tinha tudo para ser um grande paradigma de sucesso econômico. No entanto, a Argentina fez a opção pelo subdesenvolvimento.
É um caso único de nação que riquíssima no início do século XX, andou consistentemente para trás desde a década de 1940.
A neurótica vontade argentina de dar errado foi sintetizada brilhantemente pelo célebre Roberto Campos em artigo de agosto de 1996 - "A Nostalgia das ossadas"-, como a conjunção de três complexos: a "hipóstase da personalidade", o "complexo da madona" e "fascínio das ossadas".
A personalidade argentina é bastante conturbada: o argentino é um italiano que fala espanhol e gostaria de ser inglês. Não é à toa, que na Argentina há o maior índice de psiquiatras e psicólogos por habitante do mundo.
Uma identidade confusa necessita de guias. E os guias surgiram com a ideologia por trás do Partido Justicialista, que dava apoio a Juan Domingos Perón, principal líder do país no pós-guerra. O movimento peronista se mostrou extremamente danoso.
Dividiu o país, tornou-o paranoico - com o plano econômico "Nação em Armas" - e irracional do ponto de vista econômico - com sindicalização total dos trabalhadores, leis trabalhistas irreais, perseguição ao empresariado, nacionalismo emotivo e inflação altíssima. 
O culto aos líderes que se iniciou com Perón, era a versão sul-americana do fascismo europeu. Mas o diferencial argentino foi que o culto à personalidade do líder evoluiu para o segundo complexo, o complexo da madona.
Evita e Isabelita, esposas de Perón, tornaram-se líderes e símbolos do peronismo, o movimento político do marido. Chega até ser irônico que a cantora pop Madonna tenha interpretado Evita no cinema.
As madonas argentinas mais antigas agora ganharam a companhia de Cristina Kirchner. Cristina mantém a tradição do peronismo evocando o falecido marido Néstor em cada ato de governo. O Kirchnerismo, em essência, nada mais é do que uma maquiagem malfeita do Peronismo.
A última campanha eleitoral foi lamentável, com o uso exagerado da imagem do ex-presidente Nestor e de um luto oportunista de Cristina, o que nos leva ao último complexo. O "fascínio pelas ossadas" é exemplificado pelo Cemitério da Recoleta, ponto turístico da capital argentina. Lá repousam os restos mortais dos lideres, que são adorados.
Evita e Perón, por exemplo, tiveram suas ossadas exumadas e transportadas inúmeras vezes, até terminarem no cemitério em Buenos Aires. Em cada exumação, um espetáculo público deprimente que paralisava o país.
Amanhã completará 30 anos do fim da Guerra das Malvinas. O arquipélago é o símbolo da decadência argentina e da vontade de andar para trás. Representa a busca por um inimigo externo e uma causa para unir a nação, como forma de esconder os graves problemas políticos e econômicos que eles vivem, graças às inúmeras escolhas erradas do passado e da sombra do peronismo.
Há 30 anos a Argentina vivia a hiperinflação, a fuga de dólares e dos investimentos, congelamento de preços e instabilidade social. De bom, apenas um canhotinho que jogava muito futebol e alegrava o povo. Infelizmente para os argentinos, parece que nada mudou.
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Rodrigo Sias é economista do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro