terça-feira, 18 de fevereiro de 2014


Senha


Ponto Final - O engarrafamento perfeito


18/02/14 10:45 | Octávio Costa (ocosta@brasileconomico.com.br)

Ganhou muito destaque e tornou-se referência um comentário do ex-ministro Delfim Netto sobre os riscos que a economia brasileira corre este ano

Com o sarcasmo que é sua marca registrada, ele afirmou que o país pode enfrentar uma tempestade perfeita, com inflação em disparada, juros nas alturas e câmbio explosivo. Foi tamanha a repercussão que Delfim pôs panos quentes na previsão e passou a dizer que o bicho não é tão feio quanto parecia. De qualquer forma, a metáfora da tempestade perfeita vingou e pode ser aplicada a outras atividades que não apenas a economia. Veja-se, por exemplo, o que está ocorrendo com o trânsito do Rio de Janeiro. As intervenções urbanas são tantas que tudo leva a crer que o objetivo do prefeito Eduardo Paes é atingir o engarrafamento perfeito. E paralisar de vez a cidade.

Sua primeira tacada foi de mestre. Da noite para dia, sem qualquer consulta à população, Paes decidiu demolir a Perimetral, via suspensa que ligava a pista do Aterro do Flamengo à Ponte Rio-Niterói e à Avenida Brasil (era o equivalente ao famoso Minhocão de São Paulo). Evidentemente, milhares de usuários ficaram sem alternativa, submetidos a uma improvisada via Binário, feitas às pressas sem sequer escoamento decente para a água da chuva. Também deixaram de ter opção as companhias aéreas que mandavam passageiros para o Galeão nos dias sem teto para operar na pista curta do Santos Dumont. Os engenheiros da prefeitura certamente não se lembraram disso.

O mais importante, segundo o prefeito, é abrir espaço para a revitalização da zona portuária. Não satisfeito em derrubar a Perimetral, Paes, esta semana, fechou o mergulhão da Praça XV e adotou mão dupla na avenida Rio Branco, num retorno ao início do século passado. Bloqueou a pista aos carros particulares e deu uma sugestão aos motoristas: "Usem o transporte público". Parece até que a população do Rio tem à disposição transportes coletivos de primeira qualidade.

Na verdade, a cidade é servida há décadas por empresas de ônibus e olhe lá. A linha do metrô é nanica e só agora, por conta das Olimpíadas, vai se estender para a Barra da Tijuca. Mesmo assim, está a séculos de distância das malhas das grandes cidades europeias. Quem sabe o prefeito está pensando em Copenhague e Amsterdam e quer ver os cariocas pedalando de casa para o trabalho.

Ontem, no primeiro dia das mudanças na Praça XV e na Rio Branco, o Rio sofreu horrores. A fila de ônibus (uma das opções sugeridas) ia da Candelária até o Canal do Mangue. O centro da cidade ficou vazio. Parecia feriado com várias lojas fechadas. O que aconteceu? As pessoas simplesmente ficaram presas no grande congestionamento, que teve reflexos da Zona Norte à Zona Sul. Foi uma manhã de cão. Mas o prefeito Eduardo Paes deve estar tranquilo.

Afinal, a evolução urbana tem seu preço. Quando o barão Haussmann destruiu mais de 120 mil casas para redesenhar Paris, também houve protestos. Aqui aconteceu o mesmo com a derrubada do morro do Castelo e com a demolição de mais de 500 prédios para a abertura da Presidente Vargas. Hoje, tudo é feito em nome da modernização do porto. E como cereja do bolo, Eduardo Paes ainda pode entrar para a história com o engarrafamento perfeito. Ostentará em seu currículo o dia em que o Rio de Janeiro parou.