Haitianos estão
entrando no Amazonas pela Venezuela
Após tragédia que
abalou o Haiti em 2010, muitos cidadãos continuam procurando no Amazonas a
possibilidade de uma vida melhor
Manaus (AM), 16 de Janeiro de 2014
RENILDO RODRIGUES
Em 2011 e 2012 milhares de haitianos vieram para o Amazonas (Antonio
Menezes/ 24/jan/2012)
A situação dos haitianos em 2014,
quatro anos após o terremoto que devastou o país, pouco mudou. Enquanto
isso, a reconstrução do Haiti segue a passos lentos, e a economia, que já era a
mais pobre das Américas, sofreu um revés que jogou o país ainda mais fundo na
miséria e no abandono. Para fugir dessa situação, muitos haitianos têm visto
como única opção deixar o país.
O Norte do Brasil, principalmente o
Amazonas, continua recebendo todos os meses centenas de imigrantes do país
caribenho que chegam em busca de uma vida melhor. Recentemente, a Venezuela tem
sido uma nova porta de entrada dos refugiados para o Amazonas, que agora trazem
consigo famílias inteiras. Até então, a rota mais comum dos haitianos era pela
fronteira com a Colômbia, via Tabatinga (AM), e com o Peru, via Brasiléia (AC).
De Tabatinga, muitos seguem para Manaus, onde há mais oportunidades de emprego.
Quem confirma o fato é o
padre Valdeci Molinari, responsável pela Paróquia de São Geraldo, na Zona
Centro-Sul de Manaus, principal abrigo dos imigrantes, afirmando que o número
de haitianos vindo morar no Estado também aumentou.
Num caso que que chamou a atenção do
Brasil nesta semana, o número de haitianos que chegaram ao país, pela fronteira
com o Peru, no estado do Acre, triplicou. Autoridades locais cogitam fechar
novos acessos, pela falta de condições de dar abrigo e alimentação a tantas
pessoas. Alojamentos com capacidade para 300 estariam abrigando 1.200 pessoas.
No Amazonas, a situação, se não chega a
esse extremo, também preocupa, de acordo com o padre Valdeci Molinari.
Questionado por A CRÍTICA sobre a razão desse aumento, o padre afirma que foi a
situação econômica da Venezuela, país em que a maioria desses imigrantes tentou
se estabelecer, a principal responsável. “A instabilidade, a falta de
perspectivas, o medo, tudo isso fez com que muitos desses haitianos desistissem
de tentar a sorte na Venezuela e viessem pra cá”, explica o pároco.
Trabalho pastoral
Envolvido diretamente no acolhimento
aos refugiados – a Paróquia de São Geraldo, em Manaus, concentra a maior
comunidade de haitianos da cidade –, Valdeci acredita que a situação deles, em
2014, não melhorou na comparação com 2010 – na verdade, pode estar até pior. “A
entrada e a permanência de haitianos no Brasil é muito facilitada pelo Governo
Federal. O governo é uma mãe fantástica pra eles. O problema é que são
oferecidas todas as condições pra que eles entrem no país, mas não se dá
estrutura nenhuma pra recebê-los”, afirma.
A situação é ainda mais grave pelo fato
de que desta vez a maioria dos imigrantes são famílias, e não homens solteiros.
“Quando eram só homens, era mais simples: as empresas podiam aproveitá-los nas
obras, eles podiam se deslocar com mais facilidade para outros estados.
Famílias inteiras, principalmente mães com seus filhos, têm muito mais
dificuldade em se estabelecer, em encontrar boas condições de vida, alem do
quê, são pessoas que necessitam de mais cuidados”, desabafa.
Para atender a essa demanda, a Paróquia
conta com o apoio da população. “Praticamente 80% dos alimentos consumidos
pelos imigrantes chegam através de doação”, revela o padre. “Colchões, lençóis,
roupas, utensílios de limpeza e higiene, várias outras coisas chegam graças à
solidariedade das pessoas, mas, se o número de imigrantes continuar aumentando,
eu não sei como vamos fazer”, preocupa-se Valdeci.
Segundo os registros da Paróquia, em
janeiro, 84 haitianos chegaram a Manaus. O número é inferior aos meses
anteriores, onde a média era entre 120 e 140 imigrantes. “A situação começou a
piorar em agosto do ano passado, que é quando começou a aumentar muito o número
de haitianos. Nesse mês, a situação melhorou um pouco. Mas as notícias recentes
não são animadoras, e, se continuar assim, podemos viver outra situação de
tensão como foi em 2010. A gente espera poder contar com o apoio da prefeitura,
do governo, pra que isso não se repita”, conclui.
Ainda segundo a Paróquia, a estimativa
é que cerca de 2.500 haitianos vivam em Manaus atualmente. No ano passado, a
capital recebeu cerca de 1.600 novos refugiados do país.