segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Ponto Final – Lobos em pele de cordeiro na mídia

25/11/13 10:45 | Octávio Costa (ocosta@brasileconomico.com.br)

Na edição do último sábado, o tema da manchete do “Le Monde” era o seguinte: “Existe um movimento social de direita?”.
O tradicional jornal da esquerda francesa questionava se a crescente contestação aos projetos do governo socialista do presidente François Hollande é a expressão de uma raiva conservadora que pode tomar conta das ruas. No debate de duas páginas, um dos articulistas afirma que a direita avança nas classes populares porque a esquerda se afastou do povo. E ressalta que, em períodos de fartura se pode oferecer um governo ineficaz, mas nunca em tempos de crise econômica. Esse tipo de discussão política na França é feita sem disfarces pela imprensa. "Le Monde" é veículo das preocupações da esquerda, assim como o "Le Figaro" é porta-voz do pensamento de direita.
Dificilmente alguém verá um grande jornal brasileiro se posicionar diante dos fatos com a nitidez ideológica da imprensa francesa. Aqui no Brasil, ao longo dos anos, a imprensa seguiu uma escola diferente. Baseou-se mais na experiência americana e inglesa que, na teoria, propõe-se a analisar os fatos acima das paixões políticas. O jornalismo, nessa visão, deve ser imparcial e neutro. Deve transmitir as informações com a maior fidelidade possível, deixando as interpretações para os leitores. Repórter é apenas a correia de transmissão das notícias, um mensageiro. Não deve tomar partido. A opinião do jornal fica, assim, restrita à página de editoriais.
No Rio de Janeiro, por décadas, o "Jornal do Brasil" foi o símbolo maior desse tipo de jornalismo. Os próprios leitores, nas pesquisas de opinião, apontavam o "JB" como o veículo mais imparcial e ético do país. Já "O Globo", apesar da tiragem maior e da saúde financeira, não usufruía da mesma imagem. Perdia pontos no item imparcialidade, pois era considerado conservador e simpático ao regime militar. Só após a morte de Roberto Marinho e com o fim do "JB", o jornal da rua Irineu Marinho tornou-se hegemônico em todos os sentidos. Recentemente, "O Globo" fez um mea-culpa público, admitindo que cometeu erro histórico ao apoiar o golpe contra João Goulart. Concluiu que não há solução fora da democracia.
Em linhas gerais, nossa imprensa continua fiel ao princípio da imparcialidade. E a maior parte dos jornalistas procura deixar fora das redações as posições políticas particulares. Não são pagos para defender este ou aquele partido. E tentam manter o equilíbrio em seus textos. Essa independência, porém, está ameaçada por duas correntes exaltadas. Quem acompanha a mídia hoje, no papel e na internet, depara-se com um embate inédito. De um lado, atuam articulistas conservadores que alimentam ódio mortal por tudo que diz respeito ao PT. E de outro, jornalistas que, por convicção ideológica ou mero oportunismo, defendem os petistas com unhas e dentes. Enquanto uns querem ver Dirceu e Genoino mofarem na prisão, os outros afirmam que Joaquim Barbosa também deveria ir para a Papuda.
As duas correntes se digladiam sem pudor e contaminam a longa tradição da equilíbrio. Enquanto na França os veículos de comunicação assumem suas posições ideológicas, nesse novo jornalismo que se pratica no Brasil a opinião é claramente enviesada, mas com roupagem de independência. São lobos em pele de cordeiro. Mais do que nunca, o leitor tem de tomar cuidado e separar a opinião sectária da informação legítima.