sábado, 16 de agosto de 2014


Analistas têm dúvidas sobre o efeito Marina

Com cenário eleitoral praticamente zerado após a morte de Eduardo Campos, analistas divergem sobre o destino dos votos direcionados ao ex-governador de Pernambuco

Edla Lulaelula@brasileconomico.com.br

A disputa eleitoral pode ter sido zerada com a morte de Eduardo Campos e ainda não há consenso sobre o destino dos votos do falecido candidato do PSB à Presidência da República. “A única coisa que temos a dizer hoje é que vai começar tudo de novo”, diz o cientista político e professor da UnB João Paulo Peixoto. Caso se confirme a candidatura da atual vice, Marina Silva, a tendência, arrisca Peixoto, é que ela surja como a grande ameaça ao favoritismo da presidenta Dilma Rousseff.

“Aécio Neves e Eduardo tinham perfis políticos muitos semelhantes e possuíam propostas parecidas, como o choque de gestão e as reformas políticas. Agora, a ausência de Eduardo vai favorecer Aécio. Quem pensa e acredita nessas ideias deles, agora só têm uma opção, que é votar em Aécio”, opina Peixoto, que vê, por outro lado, similaridade entre os eleitores de Marina e Dilma. “Esta nova candidatura (Marina) deve tirar mais votos de Dilma”.

Outro aspecto que, na opinião de Peixoto torna a chapa PSB-Rede mais competitiva, ameaçando Dilma, é o fato de Marina Silva ser mais conhecida no plano nacional do que Eduardo Campos.

Professor emérito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Fábio Wanderley Reis discorda de que haja um perfil liberal em Eduardo Campos a ponto de trazer vantagens para Aécio Neves. “Não há dados que comprovem nenhuma preferência de setores da economia por Eduardo. Muito menos o eleitor histórico dele possui este perfil liberal”.

Ao contrário disso, o cientista aposta que a morte do candidato em plena campanha prejudicará o tucano. “As pesquisas não indicavam o crescimento de Eduardo. Ele estava, ao final, onde sempre esteve. Agora, com Marina trazendo os votos que teve em 2010 e a projeção que alcançou com a polêmica da criação do seu partido Rede, ela deve crescer e se tornar uma ameaça para Aécio no primeiro turno”, opina Reis.

Ele afirma que a possível indicação de Marina para assumir a disputa eleva a possibilidade do segundo turno. “Pelas pesquisas feitas até então, ainda havia chance de vitória de Dilma no primeiro turno. Com Marina, as chances de segundo turno são maiores”.

Cauteloso, o professor de Ciência Política da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Jairo Nicolau prefere traçar suas análises a partir de cenários anteriores, já que a situação que se desenha agora se aproxima do contexto de 2010, quando a disputa envolveu o PT, o PSDB e o PV.

“Nunca houve, na história das eleições brasileiras, uma situação semelhante, o que torna ainda mais difícil fazer conjecturas quando o episódio acabou de acontecer e a população está tomada pela comoção”, salienta.

Por isso, o pesquisador prefere se debruçar sobre os dados concretos de eleições passadas. “Olhando para a última eleição, em 2010, continuo achando que a polarização entre o PT e o PSDB é inevitável”, avalia Nicolau.

Insistindo que ainda é prematuro fazer os cruzamentos, o cientista duvida até mesmo de pesquisas que já estão sendo feitas e devem ser divulgadas semana que vem: “Esta primeira pesquisa estará contaminada pelo clima emocional. Por isso, não revelará, de fato, as tendências do eleitor”.

Ele lembra que o PSDB é um partido forte e soma a isso a complexidade dos quadros que se formaram no âmbito regional. “É muito difícil que a Marina tire a diferença que já havia entre Aécio e Eduardo sem apoio nos estados”.

Um exemplo disso é a configuração que se formou no Distrito Federal. O senador Cristovam Buarque, liderança local que, contrariando seu partido, o PDT, no plano nacional, subiria nos palanques com Campos, agora repensa o apoio. “As coisas ainda não estão definidas. Mas a minha tendência, agora, é apoiar a candidata do meu partido, Dilma Rousseff”, disse o parlamentar.

Jairo Nicolau aponta ainda que, segundo as pesquisas, os votos de Eduardo Campos estavam concentrados no Nordeste, mais especificamente em Pernambuco, de onde foi governador. “No Nordeste, a preferência do eleitorado está com Dilma, o que leva a crer que os votos do candidato lá devem migrar para ela”, analisa.

Seis meses após aliança, vice ainda superava Campos

Datafolha de julho revela que migrações de votos no segundo turno não  são favoráveis a Dilma

Apesar do clima de consternação nacional em todos os partidos políticos com a morte precoce de Eduardo Campos, o calendário eleitoral apertado obriga a uma reavaliação geral, em curto tempo, do novo quadro após o fatídico 13 de agosto. A principal questão é: como a provável candidatura de Marina Silva poderá afetar a campanha dos dois líderes em todas as pesquisas, Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB).

Dentre as pesquisas divulgadas até agora, a única que fez um cruzamento entre as intenções de voto em primeiro e segundo turno foi a do Datafolha — que, na quarta-feira, horas após a morte de Campos, registrou nova sondagem de intenção de votos no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e, ontem mesmo, começou as entrevistas. O resultado poderá ser divulgado já na segunda-feira.

A última pesquisa do Datafolha foi feita há um mês, nos dias 15 e 16 de julho. Nela, constata-se que tanto entre os eleitores que têm o PSB como partido de preferência, quanto entre aqueles que votariam em Eduardo Campos no primeiro turno, a intenção de voto da maioria, no segundo turno, seria para o tucano Aécio Neves. Ao mesmo tempo, caso o segundo turno fosse entre Campos e Dilma, o socialista teria a grande maioria dos votos dos eleitores que têm o PSDB como partido preferido, ou que votaram em Aécio Neves no primeiro turno.

Esses dados mostram que a substituição de Eduardo Campos por Marina ou outro candidato socialista não deverá alterar a migração de votos no segundo turno: a tendência é de favorecimento a Aécio Neves, e não a Dilma. E se o candidato do PSB (Marina ou outro socialista) chegasse ao segundo turno, Dilma tampouco aproveitaria os votos dos tucanos.
A última pesquisa em que o nome de Marina Silva constou nas entrevistas do Datafolha foi em 2 e 3 de abril. Na seguinte, em 7 de maio, Marina já estava confirmada como vice de Campos e, por isso, seu nome foi retirado.

Os dados da pesquisa de abril não podem ser automaticamente trazidos para hoje, porque cada pesquisa retrata o momento em que ela é feita. E, de abril para cá, várias mudanças podem ter afetado a percepção dos eleitores.

Mesmo assim, revela um dado relevante: seis meses após o anúncio da aliança com Campos, em outubro de 2013, Marina continuava com muito mais intenções de votos que o candidato socialista. Em todos os cenários, Marina era a segunda colocada, à frente de Aécio. Além disso, Marina era conhecida por 86% dos eleitores, e Campos, por apenas 57%. Marina também apresentava um índice baixo de rejeição do eleitorado: apenas 21%, contra 33% de Campos.