quinta-feira, 15 de janeiro de 2015


Ajustes virão também do exterior

As moedas dos países emergentes e desenvolvidos tendem a ter suas trajetórias de desvalorização em relação ao dólar acentuadas ao longo do ano

Carlos Thadeu de Freitascarlos.thadeu@brasileconomico.com.br

Além dos desequilíbrios macroeconômicos internos, no ano de 2015 a economia brasileira também continuará contando com um cenário externo desafiador. Entretanto, os desafios no âmbito externo mudaram. Se antes os riscos eram relacionados, primeiramente, ao colapso do sistema financeiro internacional, depois, ao prolongamento da recessão nos países desenvolvidos e, por último, aos efeitos colaterais advindos das políticas monetárias ultraexpansionistas dos maiores bancos centrais do mundo, agora os principais riscos advêm do processo de normalização da política monetária norte-americana e da redução do protagonismo da China no crescimento da economia mundial.

Os ajustes nos Estados Unidos já haviam começado em 2013, com o fim do maior programa de compra de ativos da instituição. Após alguns tropeços iniciais na comunicação, o Fed conseguiu administrar um término gradual do programa, sem que houvesse grandes impactos sobre os preços dos ativos. O maior risco era que, com o fim do programa de compras, houvesse uma redução expressiva nos preços dos ativos financeiros e uma elevação nas taxas de juros do mercado que, por sua vez, trariam efeitos contracionistas, prejudicando a frágil recuperação da atividade econômica daquele país. No entanto, após a elevação temporária das taxas de juros de longo prazo, os títulos de dez anos do tesouro americano fecharam o ano de 2014 com rendimento de 2,17% ao ano, abaixo dos 3,04% ao ano.

Após o bem-sucedido, ainda que atribulado, fim do programa de alívio quantitativo, o balanço do Fed continua inflado e a taxa de juros básica de política monetária continua próxima a zero. Eliminado o risco de deflação e com a redução da taxa de desemprego, este ano deverá ocorrer o início do processo de elevação da taxa de juros do Fed. Na reunião de dezembro de 2014, dos 17 membros do Comitê de Política Monetária da instituição, 15 relataram que o ano de 2015 seria o mais apropriado para iniciar o aperto monetário para níveis que variam entre 0,5% e 1,75% ao ano.

O desafio para o Federal Reserve será conseguir a mesma comunicação efetiva que impediu uma elevação muito expressiva nas taxas de juros, na condução da normalização das compras de títulos públicos. As condições no mercado de trabalho se tornaram tema central na condução das expectativas dos agentes. De fato, a taxa de desocupação nos Estados Unidos caiu para 5,6% em dezembro, com dois meses consecutivos de resultados robustos no crescimento do emprego. No entanto, como o crescimento da renda ainda deixa a desejar, existem dúvidas sobre o aspecto inflacionário do fortalecimento do mercado de trabalho.

Se por um lado a recuperação da atividade econômica nos Estados Unidos ganha força com a ajuda do fortalecimento de seu mercado interno, por outro, as perspectivas para a China são de uma contínua desaceleração. A moderação do crescimento econômico chinês tem afetado os termos de troca dos países exportadores de commodities, que contam com o país como grande comprador, como é o caso do Brasil. Além de uma demanda mais modesta da China, as exportações brasileiras também têm sido prejudicadas pelas dificuldades de outro parceiro comercial importante, a Argentina.

Um fator positivo na área externa: a queda significativa do preço do petróleo terá impacto favorável sobre a atividade econômica dos países importadores líquidos da commodity. É o caso dos Estados Unidos, onde se espera que a queda do preço da gasolina dê um alívio para o bolso do consumidor. Além do impacto positivo sobre a renda das famílias, há também outros benefícios, como a redução dos custos de uma variedade de insumos.

O cenário da economia mundial em 2014 continua complexo, dado que os Bancos Centrais perseguem políticas monetárias com objetivos diferentes. A economia americana mantém sua expansão em ritmo crescente, com o fortalecimento do mercado de trabalho e possíveis pressões salariais futuras. A queda do preço do petróleo contribui para expansão da demanda dos consumidores, agindo como um incentivo tributário, dando folga ao orçamento familiar. Os EUA devem apresentar crescimento econômico maior que o esperado em 2015, próximo de 3,0%, diante dos 2,5% em 2014. Por outro lado, os demais países desenvolvidos e emergentes, principalmente os europeus, devem apresentar atividades econômicas bastante fracas. Logo, consequentemente o dólar deve fortalecer-se mais ainda em relação às moedas desses países, cujas economias deverão continuar bastante desaceleradas.

Nesse contexto, as moedas dos países emergentes e desenvolvidos tendem a ter suas trajetórias de desvalorização em relação ao dólar acentuadas ao longo do ano, sendo que os países dependentes das exportações de commodities, ao terem seus termos de troca deteriorados, podem eventualmente sofrer mais que os desenvolvidos.

O segundo enfoque relaciona-se com o quadro de endividamento excessivo que ainda segura a demanda dos países desenvolvidos. Os países industriais aonde se notam reduções significativas do endividamento privado são os EUA e Reino Unido, que não por acaso são as únicas economias maduras que têm apresentado desenvolvimento econômico satisfatório no cenário pós-crise.

Assim sendo, em 2015, o Brasil vai conviver com um cenário de grande incerteza, no qual, além dos ajustes dos desequilíbrios internos, enfrentará também um cenário externo desafiador, de recuperação econômica bastante desigual entre os países, políticas monetárias divergentes entre os Bancos Centrais e eventuais crises de aversão ao risco.