Apagão expõe risco de
abastecimento no Sudeste e Centro-Oeste do país
Falta de água em
grande parte dos reservatórios do país e restrições à transferência de energia
levam ONS a determinar corte parcial no abastecimento das regiões Sul, Sudeste
e Centro-Oeste
Nicola
Pamplonanicola.pamplona@brasileconomico.com.br
Rio - O corte parcial de energia que atingiu ontem dez estados e o
Distrito Federal expôs o risco de abastecimento das regiões Sudeste e
Centro-Oeste neste verão. Segundo especialistas, a medida, que evitou um apagão
de maiores proporções, é um sinal de que o Sistema Elétrico Nacional (SIN) não
teve condições de atender ao pico de demanda ocorrido no início da tarde de
ontem, provocado pelo forte calor. A perspectiva é que, mantido esse cenário,
novos cortes terão de ser impostos até o fim da estação mais quente do ano.
Os cortes foram determinados às 14h55 e atingiram todos os estados das
regiões Sudeste, Centro-Oeste e Sul. Segundo o Operador Nacional do Sistema
Elétrico (ONS), a medida foi necessária porque “restrições na transferência de
energia das Regiões Norte e Nordeste para o Sudeste, aliadas à elevação da
demanda no horário de pico, provocaram a redução na frequência elétrica”,
derrubando usinas térmicas e hidrelétricas nas regiões afetadas. O corte
representou quase 5% da carga de energia do país, ou cerca de 3,5 mil megawatts
(MW) médios e foi feito previamente, para evitar que o sistema todo fosse
derrubado.
O abastecimento começou a ser regularizado por volta das 15h, tendo sido
totalmente restabelecido às 15h45, segundo nota oficial do ONS. O período em
que a medida foi implementada tem registrado picos de consumo devido ao elevado
uso de aparelhos de ar condicionado — todos os últimos recordes de demanda
instantânea de energia no país se deram entre as 14h30 e as 15h30.
Em comunicado oficial, o ONS fez questão de frisar que havia “folga de
geração no Sistema Interligado Nacional (SIN)” na hora do incidente. O problema
é que há restrições físicas para a importação de energia das regiões Norte,
onde as usinas não enfrentam problemas hídricos, e Nordeste, que tem gerado
grandes volumes em térmicas a óleo. Por isso, não foi possível aumentar os
volumes de transferência para atender ao pico de consumo do início da tarde —
cujo valor não foi informado.
“Estamos caminhando na beira do precipício e o governo não especifica
medidas para evitar novos problemas”, comenta Roberto D’Araújo, diretor do
instituto Ilumina. Segundo ele, com os reservatórios em baixa, as hidrelétricas
das regiões Sudeste e Centro-Oeste não têm condições de ampliar a oferta nos
horários de pico de demanda. Com térmicas e as linhas de transmissão operando
no limite, a alta demanda levou a uma queda na frequência do sistema de
transmissão.
O ONS informou ontem que vai se reunir hoje com os agentes envolvidos
para analisar a ocorrência. Mas, para técnicos ouvidos pelo Brasil
Econômico , há pouco a se fazer do ponto de vista do atendimento, pois
as linhas de transmissão têm limitações físicas e as condições de geração do
Sudeste e Centro-Oeste estão debilitadas pela falta de chuvas. “É um sinal
gravíssimo de que o sistema não está conseguindo entregar a quantidade de
energia que a demanda precisa”, diz D’Araújo.
“É claro que as causas precisam ser melhor investigadas e esclarecidas,
mas achamos que o episódio de hoje foi mais uma evidência que o sistema de
geração-transmissão está estressado”, comentou Luiz Barroso, da consultoria PSR
Energy. Mesmo com as medidas para poupar água, os reservatórios do Sudeste e do
Centro-Oeste fecharam o domingo em 18,3% de sua capacidade, o que representa
queda acumulada de 1,1% no mês.
Com as altas temperaturas previstas para as próximas semanas, a
expectativa é que o consumo se mantenha em alta, ampliando o risco de que a
situação se repita. O programa de operação do sistema para esta semana aposta
que o momento de maior consumo nas regiões Sudeste e Centro-Oeste se dará na
próxima quinta-feira, dia 22, atingindo 47,3 mil MW — volume bem inferior ao
recorde histórico de 51,3 mil MW atingido às 14h23 do último dia 13.
Nem o Ministério de Minas e Energia (MME) nem a Agência Nacional de
Energia Elétrica (Aneel) se pronunciaram sobre o tema até o fechamento desta
edição, alegando a necessidade de aguardar informações do ONS. “Neste primeiro
momento quem se manifesta sobre os detalhes da ocorrência é o ONS, órgão que
opera e despacha o sistema. A Aneel entra no processo posteriormente com a
fiscalização e responsabilização de possíveis culpados”, disse a agência
reguladora.
Com a queda de frequência no sistema de transmissão, foram desligadas 11
usinas geradoras nas regiões Sudeste, Centro-Oeste e Sul — o que estendeu os
problemas também para os estados desta última região. Uma delas foi a usina
nuclear Angra 1, operada pela Eletronuclear, que foi desligada pelo sistema de
segurança após detecção da variação de frequência na rede.