terça-feira, 20 de janeiro de 2015


Apagão expõe risco de abastecimento no Sudeste e Centro-Oeste do país

Falta de água em grande parte dos reservatórios do país e restrições à transferência de energia levam ONS a determinar corte parcial no abastecimento das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste

Nicola Pamplonanicola.pamplona@brasileconomico.com.br

Rio - O corte parcial de energia que atingiu ontem dez estados e o Distrito Federal expôs o risco de abastecimento das regiões Sudeste e Centro-Oeste neste verão. Segundo especialistas, a medida, que evitou um apagão de maiores proporções, é um sinal de que o Sistema Elétrico Nacional (SIN) não teve condições de atender ao pico de demanda ocorrido no início da tarde de ontem, provocado pelo forte calor. A perspectiva é que, mantido esse cenário, novos cortes terão de ser impostos até o fim da estação mais quente do ano.

Os cortes foram determinados às 14h55 e atingiram todos os estados das regiões Sudeste, Centro-Oeste e Sul. Segundo o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), a medida foi necessária porque “restrições na transferência de energia das Regiões Norte e Nordeste para o Sudeste, aliadas à elevação da demanda no horário de pico, provocaram a redução na frequência elétrica”, derrubando usinas térmicas e hidrelétricas nas regiões afetadas. O corte representou quase 5% da carga de energia do país, ou cerca de 3,5 mil megawatts (MW) médios e foi feito previamente, para evitar que o sistema todo fosse derrubado.

O abastecimento começou a ser regularizado por volta das 15h, tendo sido totalmente restabelecido às 15h45, segundo nota oficial do ONS. O período em que a medida foi implementada tem registrado picos de consumo devido ao elevado uso de aparelhos de ar condicionado — todos os últimos recordes de demanda instantânea de energia no país se deram entre as 14h30 e as 15h30.

Em comunicado oficial, o ONS fez questão de frisar que havia “folga de geração no Sistema Interligado Nacional (SIN)” na hora do incidente. O problema é que há restrições físicas para a importação de energia das regiões Norte, onde as usinas não enfrentam problemas hídricos, e Nordeste, que tem gerado grandes volumes em térmicas a óleo. Por isso, não foi possível aumentar os volumes de transferência para atender ao pico de consumo do início da tarde — cujo valor não foi informado.

“Estamos caminhando na beira do precipício e o governo não especifica medidas para evitar novos problemas”, comenta Roberto D’Araújo, diretor do instituto Ilumina. Segundo ele, com os reservatórios em baixa, as hidrelétricas das regiões Sudeste e Centro-Oeste não têm condições de ampliar a oferta nos horários de pico de demanda. Com térmicas e as linhas de transmissão operando no limite, a alta demanda levou a uma queda na frequência do sistema de transmissão.

O ONS informou ontem que vai se reunir hoje com os agentes envolvidos para analisar a ocorrência. Mas, para técnicos ouvidos pelo Brasil Econômico , há pouco a se fazer do ponto de vista do atendimento, pois as linhas de transmissão têm limitações físicas e as condições de geração do Sudeste e Centro-Oeste estão debilitadas pela falta de chuvas. “É um sinal gravíssimo de que o sistema não está conseguindo entregar a quantidade de energia que a demanda precisa”, diz D’Araújo.

“É claro que as causas precisam ser melhor investigadas e esclarecidas, mas achamos que o episódio de hoje foi mais uma evidência que o sistema de geração-transmissão está estressado”, comentou Luiz Barroso, da consultoria PSR Energy. Mesmo com as medidas para poupar água, os reservatórios do Sudeste e do Centro-Oeste fecharam o domingo em 18,3% de sua capacidade, o que representa queda acumulada de 1,1% no mês.

Com as altas temperaturas previstas para as próximas semanas, a expectativa é que o consumo se mantenha em alta, ampliando o risco de que a situação se repita. O programa de operação do sistema para esta semana aposta que o momento de maior consumo nas regiões Sudeste e Centro-Oeste se dará na próxima quinta-feira, dia 22, atingindo 47,3 mil MW — volume bem inferior ao recorde histórico de 51,3 mil MW atingido às 14h23 do último dia 13.

Nem o Ministério de Minas e Energia (MME) nem a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) se pronunciaram sobre o tema até o fechamento desta edição, alegando a necessidade de aguardar informações do ONS. “Neste primeiro momento quem se manifesta sobre os detalhes da ocorrência é o ONS, órgão que opera e despacha o sistema. A Aneel entra no processo posteriormente com a fiscalização e responsabilização de possíveis culpados”, disse a agência reguladora.

Com a queda de frequência no sistema de transmissão, foram desligadas 11 usinas geradoras nas regiões Sudeste, Centro-Oeste e Sul — o que estendeu os problemas também para os estados desta última região. Uma delas foi a usina nuclear Angra 1, operada pela Eletronuclear, que foi desligada pelo sistema de segurança após detecção da variação de frequência na rede.