quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Trem de alta velocidade ou trem-fantasma?

Há certos assuntos no Brasil que renascem de tempos em tempos, depois de aparentemente enterrados. São uma espécie de Fênix ou de Jason Voorhees do mundo econômico.
É o caso do trem-bala, ou TAV (Trem de Alta Velocidade). Mas, diferentemente do pássaro da mitologia, o plano megalomaníaco de uma ferrovia ligando São Paulo e Rio de Janeiro não existe apenas no território das lendas.
Por outro lado, à semelhança do protagonista da série Sexta-feira 13, ele provoca ondas de terror sempre que reaparece, renovado e fortalecido. É difícil entender a capacidade de sobrevivência de um projeto que, por suas próprias falhas e incoerências, carece de sustentação.
O governo já recebeu sinais de que o trem-bala será a crônica de um fracasso anunciado. Há quase 30 anos, fala-se dessa estrada de ferro como se fosse a panaceia para resolver os problemas logísticos, justamente na região com a melhor malha de transporte rodoviário e aéreo do país.
Duvida-se que haja retorno financeiro para cobrir os investimentos bilionários necessários.
Por isso, ninguém no meio empresarial se interessou de verdade pelo projeto. O mercado demonstrou falta de apetite pelo negócio. No primeiro leilão, realizado em julho de 2011, não houve sequer um lance.
A cada nova versão do projeto, o valor dos investimentos dá saltos de fazer inveja ao tempo de hiperinflação brasileira. Andou pela casa dos R$ 10 bilhões, foi para R$ 20 bilhões e hoje o governo fala em R$ 33 bilhões.
Mas especialistas ouvidos pelo Brasil Econômico elevam a conta para R$ 60 bilhões.
O Tribunal de Contas da União já questionou essa escalada de valores. Os estudos de viabilidade econômica foram recebidos com descaso pelos possíveis candidatos.
Enfim, não há interessados, não se sabe quanto o trem-bala custará e tampouco se o fluxo de passageiros pagará o investimento bilionário. Em compensação, o primeiro passo típico desses projetos furados já foi dado: a criação de uma estatal, com nomeação de presidente, diretoria e dotação orçamentária.
Talvez seja hora de o governo informar quem colocou a tartaruga na forquilha. Como se sabe, nenhum cágado escala muros ou árvores - se o bicho se encontra lá, é porque alguém o colocou.
O desinteresse em relação ao trem-bala está evidente. Os R$ 33 bilhões seriam suficientes para resolver boa parte (senão a totalidade) dos problemas de mobilidade urbana nos subúrbios das duas maiores metrópoles brasileiras, São Paulo e Rio de Janeiro.
Essa dinheirama corresponde a 10% do investimento necessário para eliminar todos os gargalos na infraestrutura do país, que absorveriam R$ 300 bilhões, segundo o empresário Jorge Gerdau Johannpeter.
Apesar de todos os questionamentos, o governo insiste em manter o projeto vivo, mesmo correndo o risco de ver um trem-fantasma circulando entre os dois maiores centros urbanos do país.
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Joaquim Castanheira é Diretor de Redação do Brasil Econômico