Ponto Final - Presidiários não legislam
30/08/13 12:15 | Octávio
Costa (ocosta@brasileconomico.com.br)
Foi um deboche,
um tapa na cara da opinião pública. As expressões são fortes mas fazem justiça
à votação da Câmara que salvou o mandato do deputado Natan Donadon.
Condenado pelo desvio de R$ 8,4 milhões na
Assembleia Legislativa de Rondônia, ele cumpre pena de 13 anos de prisão na
Papuda em Brasília, após processo que terminou com decisão histórica do STF.
Anteontem, desembarcou de um camburão para fazer a própria defesa no plenário
daquela Casa.
Depois de um discurso emocionado, o autor de crimes
de peculato e formação de quadrilha teve o mandato preservado. Foram 131 votos a
seu favor, 233 contra e 41 abstenções. Para a cassação, bastava a maioria
simples, ou seja 257 votos dos 513 deputados.
Donadon ajoelhou-se e agradeceu a Deus, antes de
ser novamente algemado. Mas qualquer que fosse sua defesa, a conta não era para
fechar mesmo, pois 104 parlamentares sequer participaram da votação. Eles,
certamente, não concordavam com a cassação, mas adotaram a atitude mais covarde
de todas e se ausentaram do plenário.
Pode-se dizer que os 104 deputados, ao abrirem mão
da representação a que têm direito, decidiram se esconder dos eleitores.
Simplesmente não honraram os votos que receberam (à exceção do motivo de força
maior, por questões de saúde, por exemplo). Todos sabiam que o destino de um
colega estava em jogo, o que exigia o comparecimento. Mas 50 deles registraram
a presença e não votaram, enquanto 54 simplesmente não apareceram para
trabalhar.
Entre os 50 que se fingiram de mortos no plenário,
onze são deputados do PT, nove do PMDB e 8 do PP. Alguns nomes não chegam a
surpreender, pois também têm os mandatos no fogo. Mas outros exemplos
surpreendem. Todos sabiam que negar o quórum era o mesmo que votar a favor de
Donadon. No final, faltaram apenas 14 votos para que o mandato do condenado
fosse cassado. E a Câmara cobriu-se de vergonha pela omissão de um quinto de
seus membros.
Se os nobres deputados acreditam, de fato, que um
colega pode exercer o mandato de uma cela no presídio, fica comprovada a total
insanidade da classe política brasileira. Não adianta dizer que ficaram
emocionados com o depoimento de Donadon sobre o drama que vive na prisão e as
dificuldades financeiras de sua família.
Por esse critério, todos os detentos da Papuda
deveriam ser imediatamente reintegrados à vida social, porque também devem ter
histórias dramáticas para contar. Ainda bem que o presidente da Câmara,
Henrique Eduardo Alves, mostrou-se lúcido e concluiu que Donadon está impedido
de exercer sua função. Como presidiários não legislam, convocou o suplente de
Donadon, o ex-ministro Amir Lando, do PMDB de Rondônia.
Alguns deputados apostaram na decisão absurda para
criar precedente que pode beneficiar colegas também condenados pelo STF. Creem
que abriram a porteira. Mas a trapaça não deve e nem pode prosperar. Tramita no
Congresso o projeto que prevê a perda automática de mandato para condenados
pela Justiça. Outra iniciativa, já aprovada nas comissões, propõe o fim do voto
secreto nas votações sobre cassação. Não haverá espaço, portanto, para outro
caso Donadon. Só assim a Câmara conseguirá escapar de um novo vexame. Como
advertiu ontem Amir Lando, "o povo tem o direito de execrar essa
Casa".
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Octávio Costa é Chefe de Redação do Brasil Econômico