quarta-feira, 6 de maio de 2015

O que deu na CVM?
Será que a Comissão de Valores Mobiliários passará a interferir na economia interna das empresas de capital aberto? Avaliará, por exemplo, a política de pessoal das sociedades listadas em bolsa?
Octávio Costa ocosta@brasileconomico.com.br
Quando Eike Batista estava no auge do prestígio e era incluído entre os homens mais ricos do mundo, muita gente estranhou que a Comissão de Valores Mobiliários se mantivesse alheia aos movimentos do empresário no mercado de ações. Sem mostrar preocupação com as leis do mercado de capitais, o dono do grupo X fez um verdadeiro carnaval na bolsa de valores. Em mensagens na internet, convocou os desavisados a se associarem a seus investimentos no setor de energia garantindo que havia descoberto valiosas reservas no pré-sal. Usou e abusou das mídias sociais e também dos demais meios de comunicação, vendendo um filão de riqueza inesgotável. A CVM acompanhou tudo com paciência de Jó. Afirmou que estava de olho em Eike, mas não podia atropelar os procedimentos administrativos. Só enquadrou o ex-bilionário depois que suas empresas foram à lona. Mas era tarde.
Como saiu chamuscada no caso X, a CVM agora resolveu mostrar uma agilidade inédita e desconcertante. Com base em três processos administrativos abertos entre agosto de 2013 e outubro de 2014, a autarquia que fiscaliza o mercado de capitais abriu um processo sancionador contra ex-membros do Conselho de Administração da Petrobras. Estão sendo investigados, entre outros, o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, a atual presidente da Caixa, Miriam Belchior, o presidente da Eletrosul, Marcio Zimmermann, e o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, o único que continua no conselho. O objetivo do inquérito é apurar se os referidos acusados induziram os investidores da Petrobras a erro, ao aprovarem decisões que afetaram negativamente os resultados.
A CVM faz questão de explicar que o processo nada tem a ver com as denúncias da Operação Lava-Jato. Trata-se de averiguar a responsabilidade dos acusados por aprovarem a política de preços da estatal e o plano de investimentos para o período 2014/2018. Revela a autarquia que, nas três reclamações, os investidores questionaram as idas e vindas nos preços dos derivados de petróleo. “A acusação se baseia na falsa expectativa que foi gerada ao mercado em razão da divergência entre as divulgações feitas pela companhia sobre a política de preços e a forma como ela foi levada a efeito pelos administradores na prática”, afirmou a nota divulgada pelo colegiado da CVM.
O que está sendo investigado, portanto, não é a formação artificial de preços das ações. O processo aberto contra os ex-conselheiros põe em xeque o plano de negócios e a política de preços da Petrobras. O que é espantoso. Ao que se sabe, essas questões fogem totalmente à competência da agência reguladora.
Ou será que, a partir de agora, a CVM passará a interferir nas questões de economia interna das empresas de capital aberto? Entrará em sua órbita, por exemplo, a política de pessoal e de salários das sociedades listadas em bolsa? Não dá para acreditar que a CVM pretende ter voz ativa sobre os planos de investimento das empresas nacionais. Não tem cabimento questionar a política de preços dos combustíveis, a não ser que se desconfie do uso de informação privilegiada por parte dos ex-conselheiros. Aí, sim, haveria o que apurar.
Em vez de investir num processo que não vai dar em nada, a CVM deveria mostrar mais agilidade na sua função primordial de xerife do mercado. Espera-se que coíba a manipulação nos pregões, mas em tempo hábil. É para isso que a CVM existe.