E se o ministro Levy
estiver errado?
São naturais as
reações negativas à receita de Joaquim Levy. Economistas temem que reduza ainda
mais os investimentos e aprofunde a recessão
Octávio
Costaocosta@brasileconomico.com.br
Deu ontem no jornal: longe da família, que está nos Estados Unidos, o
ministro da Fazenda, Joaquim Levy, aproveitou o feriadão da Páscoa para velejar
na Baía de Guanabara. Foi uma bela oportunidade para o polêmico ministro
meditar sobre os problemas em que se envolveu nas últimas semanas. Sem papas na
língua, Levy andou falando mais do que devia e, por duas vezes, foi advertido
pela presidente Dilma Rousseff — diretamente em uma ocasião e por meio da Casa
Civil na outra. No último episódio, ao falar para ex-alunos da Universidade de
Chicago, ele mostrou certo desapreço pelos empresários brasileiros e revelou
ceticismo em relação à capacidade administrativa de sua chefe. Afirmou que as
empresas brasileiras não gostam de pagar impostos e disse que a presidente
Dilma, apesar da vontade genuína de acertar, não consegue se sair bem em suas
ações. Diante da repercussão negativa, explicou que falou em caráter pessoal,
como PHD por Chicago. Sendo assim, alguém poderá concluir que a opinião
corrosiva do professor Levy não tem nada a ver com a do ministro da Fazenda.
É de se esperar, porém, que o ministro e o professor Levy estejam de
acordo no diagnóstico que fazem sobre a economia brasileira. Do contrário, no
futuro, algum dos dois poderá lavar as mãos e dizer que o governo Dilma não
seguiu exatamente a proposta capaz de pôr a economia nos eixos. Principalmente
o professor Levy, com a irreverência de franco atirador, poderá explicar que
sua receita ortodoxa sofreu mudanças no Congresso e acabou desfigurada. Se a
produção continuou em queda e a inflação não cedeu, o ministro da Fazenda, com
um sorriso amarelo, poderá confirmar o que havia dito em inglês: a ideia era
boa, mas não deu o retorno desejado. A teoria não funcionou na prática. No
Brasil, como disse Levy aos ex-alunos de Chicago, tudo é estranho. Vejam só:
tem-se por aqui a maior carga tributária do mundo, mas as pessoas não gostam de
pagar impostos. Imaginem se elas gostassem.
O tratamento de choque de Chicago para estabilizar economias combalidas
é conhecido há décadas. Basta passar o facão nos gastos públicos, reduzir benefícios
sociais, elevar as taxas de juros e se possível impedir a reposição integral
dos salários. Este conjunto de medidas impõe pesados sacrifícios aos
assalariados e suas famílias. Mas como advertiu o “papa” do monetarismo, Milton
Friedman, “não existe almoço grátis”. Portanto, não se deve perder tempo com os
custos sociais da receita ortodoxa. Aplique-se a dose amarga e fim de conversa.
Obviamente, em países democráticos, a opinião pública e alguns partidos
políticos reagem contra o pacote conservador. Afinal, por trás da formula
mágica criada por Friedman, há gente de carne e osso que sofre com a
estagflação e o desemprego.
No Chile, durante a ditadura do general Pinochet, Milton Friedman e seus
discípulos aplicaram a dose monetarista sem maior dificuldade: não havia
oposição e os dirigentes sindicais, em sua maioria, foram mortos. Mas estamos
no Brasil, em dias de democracia plena. São naturais as reações negativas às
propostas de Levy. Economistas temem que a receita ortodoxa reduza ainda mais
os investimentos e aprofunde a recessão. Com isso, o aumento da carga
tributária perderia “a eficácia”. A pergunta que fazem é simples: E se o
professor Levy estiver errado?