sexta-feira, 9 de janeiro de 2015


ONU confirma massacre no Sudão do Sul em abril de 2014; pelo menos 353 pessoas morreram

Relatório concluiu que ataques nas cidades de Bentiu e Bor tiveram deliberadamente como alvo vítimas com base em sua etnia, nacionalidade ou percebido apoio a uma das partes envolvidas no conflito em curso no país.

 

Uma mãe deslocada internamente e seus filhos no Sudão do Sul. Foto: UNMISS/Gideon Pibor

A Divisão de Direitos Humanos da Missão das Nações Unidas no Sudão do Sul (UNMISS) divulgou um relatório nesta sexta-feira (9) afirmando que há “motivos razoáveis” para crer que pelo menos 353 civis foram assassinados e outros 250 feridos em ataques nas capitais dos estados de Unity e Jonglei. Os crimes ocorreram entre 15 de abril e 17 de abril de 2014.

Após ter coletado e analisado evidências físicas e entrevistado 142 fontes, o relatório concluiu que os ataques nas cidades de Bentiu e Bor tiveram deliberadamente como alvo vítimas com base em sua etnia, nacionalidade ou percebido apoio a uma das partes envolvidas no conflito, disse a Missão da ONU por meio de um comunicado de imprensa.

“Tanto em Bentiu quanto em Bor, ataques aconteceram contra locais protegidos – um hospital, uma mesquita e uma base das Nações Unidas –, o que pode constituir crimes de guerra”, disse o relatório. “Embora o conflito tenha sido marcado por graves abusos e violações dos direitos humanos e violações graves do direito internacional humanitário, estes dois eventos parecem representar o pior momento do conflito.”

O ataque em Bentiu, capital do estado de Unity, ocorreu depois que as forças de oposição retomaram o controle da cidade, o retirando das tropas do governo. O relatório diz que pelo menos 287 civis – principalmente comerciantes sudaneses e suas famílias, que foram alvejados com base em suas origens de Darfur – foram mortos em uma mesquita; antes, outros 19 civis foram mortos no Hospital Civil de Bentiu.

Dois dias depois, um local de proteção civil da UNMISS próximo à capital do estado de Jonglei, Bor, foi atacado por um grupo de homens armados que exigiam a expulsão de todos os jovens da etnia Nuer. Após entrar à força no local de proteção, uma multidão assassinou, saqueou e sequestrou pessoas deslocadas internamente, deixando pelo menos 47 pessoas mortas, todas identificadas no relatório.

“A UNMISS condena veementemente o assassinato contínuo e o deslocamento de civis, com base em sua identidade étnica, quase nove meses após os acontecimentos de abril de 2014”, disse a representante especial do secretário-geral da ONU para o Sudão do Sul, Ellen Margrethe Loej. “Isso poderia levar a uma polarização ainda maior do país em linhas étnicas, com repercussões potencialmente graves para a situação dos direitos humanos e as perspectivas para a reconciliação.”

Quase nove meses depois dos ataques, ninguém foi responsabilizado nem pelo governo nem pela oposição. O relatório da ONU acrescenta que foram tomadas poucas medidas de responsabilização em resposta ao incidentes.

O porta-voz do Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos (ACNUDH), Rupert Colville , confirmou durante uma coletiva de imprensa ocorrida nesta sexta-feira (9) em Genebra que não houve responsabilização de contas pelas “atrocidades em massa, violações dos direitos humanos e abusos que causaram a morte de dezenas de milhares de pessoas no Sudão do Sul”.

Colville também disse que o seu escritório está preocupado com a falta de progresso no processo de paz. “Há um risco real de que os conflitos continuem. Há uma necessidade urgente de concluir um acordo de paz, respeitar o Acordo de Cessação das Hostilidades e garantir que anistias não sejam concedidas por violações graves. Sem paz, a epidemia de fome continuará a ser uma possibilidade em 2015.”

Segundo as Nações Unidas, o conflito em curso no país tem consequências terríveis para a população civil, especialmente mulheres e crianças, que têm suportado o peso da violência. Mais de 1,9 milhão de pessoas permanecem deslocadas, com outros Estados na região hospedando quase 500 mil sul-sudaneses.