sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

Diretrizes do segundo mandato

O nó da infraestrutura inferniza a vida do cidadão comum e penaliza muito os setores produtivos e a exportação. Era uma grande expectativa do primeiro mandato, que não vingou

Julio Gomes de Almeidajulio.almeida@brasileconomico.com.br
 

No discurso de posse de seu segundo mandato, a presidente Dilma Roussef comprometeu-se com pontos econômicos cruciais para o país. O primeiro é o de maior relevância a longo prazo: educação, que inspirará o lema de seu governo, "Brasil, pátria educadora". A presidente confia nos recursos do pré-sal para dar início neste ano a uma iniciativa, segundo ela, forte para, principalmente, melhorar a qualidade do ensino. Ao longo do tempo, juntamente com o progresso tecnológico e a inovação empresarial que também apresentam flagrantes debilidades no país, é de fato este o vetor mais relevante de criação de oportunidades de crescimento e avanço social.
O segundo é o ponto da infraestrutura, um nó que inferniza a vida do cidadão comum e penaliza muito os setores produtivos e a exportação. Era uma das grandes expectativas do primeiro mandato, que, no entanto, não vingou.
Um novo PAC (Plano de Aceleração do Crescimento) foi anunciado pela presidente, que frisou ainda a orientação a ser dada ao tema no segundo mandato, certamente obedecendo à provável condição de escassez de recursos para o financiamento do investimento público: as concessões e as parcerias com o setor privado formarão o eixo central dos programas.

Terceiro, a Petrobrás. O recado foi no sentido de que a empresa e seu acervo de funcionários de elevado nível, sua contribuição ao avanço tecnológico do país, seu papel no investimento agregado da economia e sua influência na organização de uma cadeia produtiva extensa e de alto valor agregado não podem ser contaminados pelos escândalos de corrupção, sob pena de grandes sacrifícios para a economia brasileira.

A promessa é combater “ferrenhamente” a corrupção, que “deverá ser extirpada”. Uma blindagem da empresa, através de um avançado sistema de governança, irá assegurar que não mais voltará a ocorrer.
Os três pontos são evidentemente muito relevantes, mas outros, embora também merecedores de destaque, foram apenas mencionados, a exemplo da questão da sustentabilidade e do relacionamento econômico com o exterior.
O Brasil pode envolver mais intensamente os compromissos de sustentabilidade com suas políticas industriais e de desenvolvimento. Na inserção externa, a presidente não indicou mudanças nas políticas atuais e sublinhou a América Latina e os acordos com os Brics, apenas acenando a “melhora do relacionamento” com os EUA e com a UE.

Outras questões mais pontuais tiveram aceno de mudança em direções corretas pela presidente, como por exemplo: 1) a adaptação do Simples para prever a transição de empresas de pequeno porte (que têm regime simplificado e de menor custo tributário) para a faixa de empresas maiores; 2) regulação para incentivar o financiamento de longo prazo com fontes privadas, já que os recursos do BNDES sofrerão redução.

Sobre o ajuste da economia, falou pouco, assim como quase nada disse sobre o crescimento econômico, talvez receosa de que o ajuste leve o crescimento do PIB a níveis ainda mais baixos neste segundo mandato do que foi no primeiro. Declarou que irá provar ser possível corrigir distorções e fazer ajustes sem voltar atrás nos avanços sociais alcançados.

Reconheceu que “temos que nos preocupar com a economia”, em parte devido ao quadro de instabilidade e incerteza externa, mas também porque houve “excessos e distorções” na política econômica anterior. E reiterou que o ajuste terá o menor impacto possível para a população.
No plano econômico, ao lado das dúvidas sobre as repercussões da crise da Petrobras e os receios decorrentes de que aí tenha origem um “efeito dominó” na economia, o grande temor é o efeito do ajuste.
Todo ajuste fiscal é restritivo do crescimento, mas quando aplicado em uma economia fragilizada como está a economia brasileira, em um momento em que todos os agentes privados não têm confiança na economia para amparar suas decisões relevantes — o banqueiro para emprestar, o empresário para investir e o consumidor para consumir — pode ampliar os desajustes, inclusive o de ordem fiscal que se deseja remover. Com isso, pode empurrar a economia para uma recessão ainda mais aprofundada do que a atual.