Brasil ainda tem muitas
lições a aprender com o México
Assim como muitos
brasileiros levam a sério a implicância com a Argentina, ainda há quem fale do
México com um certo desprezo. A visita da presidenta Dilma mudou o diálogo
entre os dois países
Heloísa Villela heloisa.vilela@brasileconomico.com.br
Foi uma visita que mudou o tom do diálogo Brasil-México. Da mesma
maneira que uma boa quantidade de brasileiros leva a sério a implicância com a
Argentina, muitos, no nosso país, ainda falam do México com um certo desprezo.
Como se o país não passasse de um grande bairro pobre atrelado aos Estados
Unidos. Por isso me surpreendeu a declaração do Subsecretário-Geral da América
do Sul, Central e do Caribe, embaixador Antonio José Ferreira Simões: “Temos
muito que aprender com o México”, disse ele, antes do almoço oferecido a Dilma
por Peña Nieto. Aquele que foi muito falado, nos dois países, por conta do
brinde à base de cachaça e tequila.
O embaixador se referia, em particular, ao negócio em torno do turismo.
Os mexicanos não brincam em serviço e não é à toa que recebem uma quantidade de
estrangeiros, regularmente, bem maior do que o Brasil. E não falta costa ao
nosso país a ser explorada. Não faltam cachoeiras, chapadas e florestas. Não
falta diversidade cultural para ser vista de perto. Porém, segundo dados do
Banco Mundial, entre 2010 e 2014, os mexicanos receberam mais de 24 milhões de
turistas estrangeiros enquanto o Brasil, com tantos carnavais e até uma Copa do
Mundo, não chegou a somar 6 milhões de visitantes. E olha que o México não sai
do noticiário internacional como lugar violento, palco da chamada guerra contra
as drogas que já matou milhares e continua aterrorizando a população.
Seria muito proveitoso para o Brasil se nessa parceria mais próxima que
se propõe agora nós pudéssemos absorver algumas lições. Eles dispensam uma
cordialidade aos turistas que vai muito além do nosso calor humano. Não ficam
apenas na simpatia. Eles fazem questão de prestar os serviços. De não deixar
faltar nada ao turista. A gente leva uma volta aqui outra ali dos motoristas de
táxi? Com certeza. Mas isso já vai na conta de qualquer viagem a um país que
não é o nosso. O que me chamou a atenção desde a primeira visita ao México, lá
pelos idos de 89/90, foi o orgulho histórico. Bastou pisar na Cidade do México
para sentir isso com força. Eles têm uma relação com a própria história que os
brasileiros não podem nem imaginar.
Foi bacana ver a presidenta Dilma Rousseff destacar, nos discursos, que
a civilização que se desenvolveu onde hoje é o México não deixou nada a desejar
aos egípcios por exemplo. Uma rápida visita ao Museu de Antropologia deixou
mais claro, e rico de detalhes, o que ela estava dizendo. Os povos que viviam
naquela região já plantavam milho em 8.000 AC. Os primeiros trabalhos em
cerâmica são de 2.300 AC. Muito antes de sucumbir ao massacre promovido pelos
espanhóis, a capital do império Asteca, Tenochtitlan, hoje Cidade do México,
era uma das maiores do mundo. Tinha cerca de 350 mil habitantes enquanto Pequim
somava entre 700 mil e um milhão e Londres não tinha mais de 80 mil. Uma
reprodução do que era o mercado da capital Asteca na época, com mercadorias em
miniatura e pequenos bonecos dispostos em uma área grande, atrás de um vidro, é
de tirar o fôlego. Ali se trocava de tudo em um movimento intenso que reunia cerca
de trinta mil pessoas por dia! E Hernán Cortés ainda nem pensava em desembarcar
por aquelas bandas. As civilizações Olmec, Izapa, Teotihuacan, Maya, Zapotec,
Mixtec, Huastec, Purepecha, Totonac, Tarascan e Asteca floresceram cerca de
4.000 anos antes do primeiro contato com os europeus. 4.000!
A grande lição está na atitude dos mexicanos com relação a toda essa
história. Qualquer motorista de táxi fala com orgulho do passado, conta que a
capital do país tem cerca de 100 museus e vai descrevendo o que cada um tem de
mais interessante. Se o trânsito está como de costume (parado), sobra tempo
para destacar que ele sim (o motorista) é um legítimo habitante das Américas.
Leva nas veias o sangue dos primeiros ocupantes daquele território. É herdeiro
dos guerreiros que desenvolveram ali conhecimentos matemáticos e obras de arte
que deixam os visitantes hoje de queixo caído, como também ficaram os
espanhóis. E talvez por isso mesmo, pelo choque de se deparar com uma cultura
tão sofisticada, os conquistadores barbarizaram... Cortaram estátuas e
esculturas pela metade e as transformaram em pernas para altares de madeira.
Ergueram catedrais sobre templos astecas. O Palácio Nacional, hoje sede do
governo, foi construído com o material que sobrou da destruição da sede do
último governo asteca.
O Museu de Antropologia conta que os espanhóis ficaram impressionados
com a decoração luxuosa, com as pinturas e murais que decoravam as edificações
astecas. Fiquei pensando nisso enquanto olhava, de longe, os murais de Diego
Rivera no Palácio Nacional. Também são impressionantes pela riqueza de detalhes
e a capacidade narrativa. Contam, em imagens, a história do país, da revolução
e da luta dos mexicanos. Segundo os historiadores, Diego Rivera tinha uma
intenção declarada com os painéis. Atacar o desprezo e o preconceito da elite
europeia com relação aos índios e mestiços do país. Eles são os personagens
principais dos murais, a força da revolução mexicana e o motor da economia do
país. Eles são os parceiros com os quais o Brasil quer agora se aliar para
alavancar a nossa economia.