É tudo muito natural
A considerar a
tranquilidade do ministro Levy, o mau momento da economia brasileira é
passageiro. No fim, tudo vai dar certo
Octávio Costaocosta@brasileconomico.com.br
Os números da economia são desoladores. Em abril, a produção industrial
caiu 1,2% em relação a março e 7,6%, se comparada ao mesmo mês do ano passado.
Sob forte impacto da queda na venda de automóveis, analistas estimam que o
segundo trimestre fechará com perda de 7%. Com este desempenho sofrível, a
indústria hoje representa apenas 10,11% do PIB, na menor fatia desde de 1996. E
não há qualquer sinal de recuperação no horizonte. Ao contrário, a General
Motors acaba de anunciar que vai reduzir a produção em 17%, cerca de 100 mil
veículos, e colocar em layoff 3.500 metalúrgicos. Segundo o presidente da GM
para a América do Sul, Jaime Ardila, “o pior ainda está para acontecer”. Em
consequência da freada na economia, a taxa de desemprego alcançou 8% em abril.
A exemplo de Ardila, especialistas afirmam que o quadro é complicado e deve
perdurar durante todo o ano. Na melhor hipótese, o desemprego ficará em torno
de 8%. E a principal vítima são os trabalhadores com carteira assinada.
Apesar do cenário sombrio, os responsáveis pela política econômica
demonstram tranquilidade de monge budista. O ministro do Planejamento, Nelson
Barbosa, em palestra na FGV, afirmou que “o esforço para o reequilíbrio fiscal
perseguido pelo país deve levar pelo menos dois anos” e disse que “não se baixa
a taxa de juros por decreto”. Em Washington, o ministro da Fazenda, Joaquim
Levy, fez coro com seu colega: “Será uma recuperação lenta. Quando as coisas
estiverem estruturadas esperamos parar de cair e começar a crescer, lentamente,
porque estas coisas você tem que construir tijolo por tijolo em sua economia”.
Depois, já em Paris, Levy, exibindo a mesma frieza nórdica, comentou o aumento
da taxa de desemprego. “O crescimento pode ser tanto pelo menor dinamismo no
número de vagas como pelo maior numero de pessoas procurando emprego. É
natural. Acho que a gente vai ter de passar por esse período enquanto tomamos
medidas para que a economia se realoque”.
A considerar a fala dos dois ministros, é preciso manter a esperança. O
desemprego de 8% é natural e a perda de fôlego da economia também. Tanto o
governo acredita que o mau momento é passageiro que o Comitê de Política
Monetária do Banco Central decidiu elevar a taxa Selic em mais 0,5 ponto
percentual. Os juros básicos subiram para 13,75% e devem passar de 14% na
próxima reunião do Copom em julho. Em nota, o BC explica que a decisão de seus
diretores foi tomada por unanimidade, “avaliando o cenário macroeconômico e as
perspectivas de inflação”. Portanto, a prioridade absoluta é o combate à
inflação. Quem o diz é novamente o ministro Levy: “O importante neste processo
é que o Banco Central continue vigilante, para evitar que o aumento de preços
num momento se transforme em processo inflacionário”. Ou seja, na explicação
oficial, os juros sobem para quebrar expectativas inflacionárias. Teme-se que o
realinhamento de tarifas contamine os demais preços e, por isso, dá-se mais uma
volta no torniquete dos juros.
Como se vê, a sexta alta consecutiva da Selic é tão natural quanto o
aumento da taxa de desemprego e o desmonte da indústria nacional. Não há motivo
para se preocupar com os efeitos do recorde mundial de juros e do ajuste
fiscal. “Nós temos bastante chance de ver um segundo semestre, uma segunda
metade do ano, favorável para economia”, prevê Levy. É uma questão de fé. No
fim, tudo vai dar certo.